Bruxelas - A União Europeia e os Estados Unidos advertiram sexta-feira a Bósnia-Herzegovina contra as consequências negativas da adopção da chamada lei de agentes estrangeiros, proposta pela presidência sérvio-bósnia.
Quer o porta-voz da delegação da UE, Ferdinand Koenig, quer a Embaixada dos Estados Unidos em Sarajevo, sublinharam que a regulamentação prevista para regular a actividade das organizações não-governamentais (ONG) e de outros grupos prejudicaria a sociedade civil do país, ao restringir as suas liberdades.
"Qualquer limitação infundada do exercício efectivo dos direitos e liberdades fundamentais, incluindo o direito de associação e de expressão, é em si contrária às aspirações da Bósnia-Herzegovina de avançar na via europeia", frisou Koenig ao portal de notícias Buka.
Para a Embaixada dos Estados Unidos em Sarajevo, esta legislação apenas beneficiaria a coligação no Governo no seu esforço para consolidar o poder, prejudicando "todos os outros".
Washington e Bruxelas reagiram, desta forma, ao recente anúncio do presidente da entidade sérvia da Bósnia-Herzegovina, o nacionalista e pro-rússia Milorad Dodik, de que está a ser preparada uma lei sobre as actividades das organizações de capital estrangeiro.
Dodik realçou que a lei será formulada segundo o modelo dos Estados Unidos e incluirá a obrigação das ONG relatarem todas as transacções e actividades.
Koenig alertou que essas exigências ameaçam reduzir significativamente o espaço para comprometimento cívico, o que é inaceitável para a UE.
Além do plano de introduzir a polémica nova lei, os EUA também criticam a proposta do Governo da entidade sérvia de alterar o Código Civil para criminalizar a difamação.
Na sequência dos acordos de paz de Dayton (1995), foram reconhecidos na Bósnia-Herzegovina três "povos constituintes" (bósnios, sérvios e croatas), com o país a confrontar-se com as ambições secessionistas dos sérvios bósnios e uma crescente fractura e afastamento entre os nacionalistas bósnios muçulmanos e croatas católicos.
Os partidos nacionalistas continuam a dirigir as respectivas entidades, num cenário de profundas divisões étnicas.
Na sua nota, a embaixada norte-americana descreveu estas leis como "repressivas, anti-democráticas", frisando que a sua adopção "prejudicaria drasticamente os direitos e liberdades" dos cidadãos.
Além disso, Washington rejeitou que a regulamentação proposta por Dodik siga um exemplo norte-americano, comparando-a com a legislação russa.
"Já vimos este filme e sabemos como termina. Quando a Rússia ampliou a sua legislação sobre agentes estrangeiros em 2020, também alegou que estava apenas a copiar o modelo norte-americano. Nada poderia estar mais longe da verdade e já vimos os resultados", apontou a Embaixada dos EUA na nota de imprensa.
"As autoridades russas usaram a sua legislação repressiva para suprimir a dissidência, eviscerar a sociedade civil e erradicar uma "média livre", acrescentou.
Os norte-americanos alertaram ainda que "uma entidade ou pessoa designada como “agente estrangeiro” pelo Governo russo está sujeita a requisitos onerosos de relatórios, inspecções policiais arbitrárias e multas exorbitantes por não se identificar".
"Alguns jornalistas podem até mesmo enfrentar penas de prisão por violar a lei de “agente estrangeiro” da Rússia", concluíram os EUA.
O anúncio de Dodik coincidiu com a crise desencadeada na Geórgia pela polémica lei de agentes estrangeiros, que foi revogada quinta-feira em face dos protestos massivos da população e da oposição.
A Geórgia, uma ex-república soviética, tem ambições de ingressar na UE e na OTAN, mas várias medidas do Governo lançaram recentemente uma sombra sobre estas aspirações e levantaram dúvidas sobre os seus laços com a Rússia.
A Rússia patrocina duas regiões separatistas na Geórgia, Abecásia e Ossétia do Sul, cuja independência reconheceu após a guerra de 2008.