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Sessenta americanos visitam Angola para vivenciar as origens dos antepassados

     Cultura              
  • Luanda • Quinta, 24 Agosto de 2023 | 14h33
Pesquisador cultural Afonso Vita
Pesquisador cultural Afonso Vita
Domingos Cardoso

Luanda - Sessenta turistas americanos chegam ao país, no próximo dia 27, dentre eles membros da família Tucker e duas equipas de basquetebol do escalão júnior, sendo uma delas a actual campeã dos Estados Unidos.

A comitiva é, igualmente, integrada por um dos vice-governadores do estado norte-americano da Virgínia.

 A informação foi avançada ao Jornal de Angola, quarta-feira, pelo pesquisador cultural Afonso Vita, durante a mesa-redonda com o tema "Abolição do Tráfico de Escravos, Legado e Reflexões”, realizada em Luanda, inserida nas celebrações do 23 de Agosto, Dia Internacional da Lembrança do Comércio de Escravos e a sua Abolição.

A estadia dos 60 turistas americanos estende-se até ao próximo dia 4 de Setembro, prevendo, durante este período, a realização de um vasto programa de actividades nas províncias de Luanda, Malanje e Cuanza-Norte, visando conhecer os locais que serviram de concentração e embarque de escravos e também ouvir de fontes locais a história deste processo.

Afonso Vita, mentor do projecto rota turística e cultural dos escravos em Angola, explicou que muitos dos turistas são pessoas cujos antepassados saíram de Angola.

Resultado da sua tese de doutoramento em Coimbra, Portugal, o projecto prevê, igualmente, o lançamento de um festival mutidisplinar no próximo ano.

"Em África temos exemplos a serem seguidos, como é o caso do Benim, Senegal e Gana, que possuem projectos bem estruturados nesta área do turismo de memória. É preciso dizer que o nosso vai ser um bocadinho diferente, porque introduzimos o festival que é para ser a âncora de captação de visitantes”, frisou.

Informou que o local da realização deste festival será em Mbanza Kongo, património da humanidade.

Afonso Vita explicou que uma das primeiras vantagens que o turismo de memória pode trazer para o país é a criação de emprego e fomento da produção cultural das localidades, factos que se reflectem na melhoria de vida das famílias.

"O que estamos a fazer já é um sinal positivo naquilo que é a divulgação do nosso passado histórico, isso quer dizer que já vai influenciar muita gente sobre o assunto. As nossas autoridades também estão a acompanhar e garantir que esse conhecimento seja transmitido por via do turismo, que permite uma experiência melhor no contacto com a história e o seu impacto na vida dos africanos”, defendeu.

O director do Museu Nacional da Escravatura, Vladmir Fortuna, um dos prelectores da mesa-redonda, ao abordar a importância da instituição que dirige para o turismo de memória, esclareceu que a mesma desempenha dois papéis fundamentais, não sendo apenas um espaço para apresentar uma exposição sobre a história da escravatura e os itinerários do tráfico de escravos.

"É no Museu Nacional da Escravatura onde se reflecte os vários pontos deste processo, como as fortalezas, palacetes e fazendas coloniais. Todos esses pontos são registados a nível do museu para, cada vez mais, consolidar a rota da escravatura e do tráfico de escravos. As visitas ao museu têm estado a crescer nos últimos anos, cada vez mais há um forte interesse por parte de investigadores nacionais e estrangeiros na história da escravatura e do tráfico de escravos”, sublinhou.

Vladimir Fortuna reconheceu que esta procura acontece muito por conta das mudanças de pensamento provocada pelos movimentos internacionais para a necessidade do conhecimento da história e ligações entre os povos que se estabeleceram no quadro da escravatura. Esse facto tem movido turistas nacionais e estrangeiros para o museu.

Quanto à sua promoção na arena internacional, almejando colocar o acervo à disposição dos vários interessados, explicou que o Museu Nacional da Escravatura é publicitado em vários sites, realçando que está em curso um projecto a nível do Ministério da Cultura e Turismo para a criação de um site que vise unicamente a divulgação dos museus de Angola, uma plataforma importante para alcançar mais gente que se interesse pela história.

"Recentemente, estivemos nos Estados Unidos e contactamos instituições que também trabalham na preservação da memória e história do tráfico de escravos, tendo ficado estabelecido a intenção da troca de informação e partilha de acervo”, informou.

 

Referências mundiais

O músico e investigador cultural, Nuno Mingas, que trabalha sobre questões ligadas à história de África, com destaque para o processo transatlântico que ocorreu há mais de quatro séculos, avaliou a mesa-redonda como uma grande oportunidade para abordar um assunto que deve interessar os africanos e a sua diáspora.

No seu entender, é um dia importante porque simboliza a luta da abolição da escravatura, ainda mais nos tempos actuais, passados sensivelmente seis séculos, para despertar a juventude contemporânea a olhar a história narrada e o que efectivamente aconteceu em África.

Na sua visão, África por ser o berço da humanidade e possuir muitas histórias ainda desconhecidas poderia ser o continente mais visitado por turistas, mas essa ainda não é a realidade deste continente.

O músico especifica que desde o Egipto até a África do Sul poderia ser uma rica rota-turística com potencialidade para atrair o turismo mundial para essa região.

Porém, avalia que uma boa parte do património cultural africano ainda não foi classificada e nem sequer elevada a património mundial, o que tem influenciado muito nesta área.

"Há registos que nos servem de orgulho, como a participação, hoje elevada para o cinema, de Jesse Owens, o primeiro negro a correr nas olimpíadas. Os direitos civis, hoje, vigoram não apenas na América como no mundo porque tiveram uma grande contribuição dos africanos. Quando olhamos para a igreja, temos referência como a Kimpa Vita. É preciso reflectirmos e criarmos uma rota turística e cultural que deve ser benéfica para todos, porque o turismo gera riqueza e mais postos de emprego”, sustentou.

A abolição do comércio transatlântico de escravos teve início com a revolta que ocorreu de 22 a 23 de Agosto de 1791, em Saint Domingue, actualmente, a República do Haiti. Desde 1994 que a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), através da Resolução 29 C/40, instituiu o dia 23 de Agosto como Dia Internacional em Memória do Tráfico de Escravos. ART

 





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