Maputo - O ex-ministro dos Negócios Estrangeiros e Cooperação de Moçambique Leonardo Simão defendeu hoje, 25, que a abstenção de Maputo nas Nações Unidas face à invasão russa da Ucrânia obedece a um princípio constitucional, que dá prioridade ao diálogo.
“Está escrito na Constituição: Moçambique dá a primazia a soluções negociadas de conflito. Por isso a posição de Moçambique é uma obediência à Constituição”, declarou Leonardo Simão, em entrevista à Lusa em Maputo.
Segundo o antigo chefe da diplomacia moçambicana, entre 1994 e 2005, este princípio estabelecido na Constituição é o resultado da experiência que o país obteve durante anos de conflito armado, desde a luta de libertação contra o regime colonial português até à guerra civil dos 16 anos.
“Os conflitos em que Moçambique esteve envolvido, de uma forma ou de outra, tiveram soluções a partir do diálogo”, acrescentou Leonardo Simão.
Por outro lado, prosseguiu o antigo governante, Moçambique possui “relações excelentes” com todas as partes envolvidas, havendo um número considerável de estudantes que se formaram tanto na Rússia como na Ucrânia.
“Moçambique tem dois amigos a lutarem e, sendo o terceiro, o que tem de fazer é tentar uni-los. Exacerbar ainda mais os ânimos de um em relação ao outro não vai ajudar. Pelo contrário, isso só vai atrasar o diálogo, que tarde ou cedo terá de acontecer”, declarou Leonardo Simão.
“Enquanto o nível de ânimos e sentimentos negativos for elevado não haverá diálogo”, frisou o antigo governante, que é embaixador itinerante de Moçambique com residência em Maputo.
A Assembleia-Geral das Nações Unidas aprovou a 24 de Março, com uma esmagadora maioria de 140 votos, uma resolução responsabilizando a Rússia pela crise humanitária na Ucrânia devido à guerra.
Dos 193 Estados-membros das Nações Unidas, a resolução, apresentada pela França e pelo México e apoiada pela Ucrânia, obteve 140 votos a favor, cinco contra e 38 abstenções, num grupo que, além de Moçambique, está Angola e Guiné-Bissau.
A Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo, partido no poder desde a independência) foi um aliado de Moscovo durante o tempo da ex-URSS, tendo recebido apoio militar durante a luta contra o colonialismo português e ajuda económica depois da independência, em 1975.
A Rússia lançou em 24 de Fevereiro uma ofensiva militar na Ucrânia que já matou mais de dois mil civis, segundo dados da ONU, que alerta para a probabilidade de o número real ser muito maior.
A ofensiva militar causou já a fuga de mais de 12 milhões de pessoas, mais de 5 milhões das quais para fora do país, de acordo com os mais recentes dados da ONU - a pior crise de refugiados na Europa desde a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).