Ancara - O Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, voltou hoje a insistir na possibilidade de desencadear uma intervenção militar terrestre na Síria contra as milícias curdas, justificada pela necessidade de garantir a segurança das fronteiras turcas.
"As nossas operações com aviões, artilharia e 'drones' são apenas o início. A nossa determinação de circundar com uma faixa de segurança a nossa fronteira, desde Hatay a Hakkari, é mais forte que nunca", disse Erdogan durante um discurso perante os deputados do seu partido islamita AKP.
O líder turco acrescentou que os governos da Síria e do Iraque não deverão manifestar inquietação por uma intervenção ou ocupação da Turquia nesses países, pelo facto das suas operações "também garantirem a sua integridade territorial".
O Governo sírio criticou hoje os últimos bombardeamentos do Exército turco contra a milícia curdo-síria Unidades de Protecção Popular (YPG) no norte do país, apesar de também ter criticado este grupo armado por manter "um projecto anti-sírio".
"Os pretextos usados pela ocupação turca para justificar as suas políticas na Síria já não enganam ninguém e qualquer frase destinada a garantir um mínimo de credibilidade deve ser acompanhada por acções no terreno, porque a segurança fronteiriça é uma responsabilidade partilhada", indicou Ayman Susan, vice-ministro dos Negócios Estrangeiros sírio citado pela agência noticiosa oficial SANA.
No terreno, o comandante das FDS no nordeste da Síria, Mazloum Abdi, assegurou que o seu grupo está preparado para repelir uma invasão terrestre turca, desde que a Turquia lançou uma ofensiva terrestre na região em 2019.
"Acreditamos ter atingido um nível que nos permite suster qualquer novo ataque. Pelo menos, os turcos não terão capacidade para ocupar mais das nossas regiões e será uma grande batalha", afirmou à agência noticiosa Associated Press (AP).
E acrescentou: "Caso a Turquia ataque qualquer região, a guerra vai alastrar a todas as regiões (...) e todos vão sofrer por isso".
Em três operações, desencadeadas em 2016 contra o EI e em 2018 e 2019 contra as milícias curdas sírias do YPG, o Governo turco garantiu o controlo de 130 quilómetros de uma faixa fronteiriça, desde o Mediterrâneo até ao rio Eufrates, e outros 150 quilómetros no centro do país.
A Turquia mantém ainda forças nas zonas nortenhas do Iraque junto à província turca de Hakkari, e onde o Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), a guerrilha curda da Turquia, mantém as suas bases recuadas.
Erdogan indicou hoje que as operações terrestres vão ser iniciadas "no momento mais adequado para a Turquia" e destinadas a "limpar" diversas zonas controladas pelo YPG.
Assegurou ainda que nos últimos sete anos foram desencadeados a partir da Síria 764 bombardeamentos contra as províncias turcas de Hatay, Gaziantep, Sanliurfa e Mardin, com um balanço de 32 mortos.
A Turquia iniciou no passado domingo uma ampla operação de bombardeamentos aéreos contra posições da milícia curda YPG no norte da Síria, e contra refúgios do PKK no norte do Iraque.
A operação, batizada "Garra Espada", foi justificada como uma represália pelo atentado de Istambul em 13 de novembro com um balanço de seis mortos, e com Ancara a atribuir de imediato a sua autoria a uma agente das YPG, apesar de esta milícia ter rejeitado qualquer envolvimento.
As YPG são consideradas pela Turquia uma "organização terrorista" e uma extensão do PKK na Síria. Por sua vez, a guerrilha curda da Turquia está incluída na lista de "organizações terroristas" por Ancara, Estados Unidos e União Europeia.
Para Erdogan, condenar o atentado de Istambul e criticar as intervenções militares de Ancara na Síria significa "chorar lágrimas de crocodilo".
O YPG tem acusado Erdogan de procurar pretextos para uma intervenção na Síria, tendo como perspetiva as eleições gerais turcas de Junho de 2023.