Cartum - O líder das Forças de Apoio Rápido (FAR, paramilitares) do Sudão, Mohamed Hamdan Dagalo, manifestou hoje a disponibilidade para um "cessar-fogo" e uma "resolução política pacífica" que "abra o caminho a uma autoridade civil legítima para governar" o país.
"É imperioso o estabelecimento de um acordo de cessar-fogo de longo termo, acompanhado de resoluções políticas abrangentes que respondam à raiz das causas dos conflitos no Sudão", afirmou Dagalo nas redes sociais X (ex-Twitter), num discurso endossado à 78.ª Assembleia Geral das Nações Unidas, um dia depois do seu adversário e presidente do Conselho Soberano do Sudão, general Abdel Fattah al-Burhan, aí ter discursado.
"A guerra iniciada no dia 15 de Abril terá que ser a guerra que acabará com todos os conflitos no Sudão", afirmou o general Dagalo, número dois no Conselho Soberano de Transição, afirmando que as FAR, grupo agora declarado rebelde por al-Burhan, estão "totalmente preparadas para declarar um cessar-fogo no Sudão".
"Isto permitirá que a ajuda humanitária chegue e garantirá a deslocação segura dos civis e do pessoal humanitário", e ainda que se "inicie um diálogo significativo e abrangente, que conduza a uma solução política compreensiva e ao estabelecimento de um governo civil, conduzindo o país na direção da transformação democrática e da paz duradoura", afirmou no final do discurso.
Dagalo, popularmente conhecido como 'Hemedti', sublinhou que o país "está a suportar a mais longa guerra da sua história moderna" e acusou a liderança das forças armadas e "os seus apoiantes do antigo regime" de Omar al-Bashir, deposto em Abril de 2019, de estarem por detrás dos combates.
"A FAR tem realizado esforços sinceros [no sentido de uma resolução do conflito] em colaboração com as forças civis, com o mecanismo tripartido - que integra a ONU, a União Africana (UA) e a Autoridade Intergovernamental para o Desenvolvimento (IGAD) -, bem como com o Quarteto - Estados Unidos, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos (EAU) e Reino Unido - desde o golpe de outubro de 2021", disse.
Abdel Fattah al-Burhan destituiu em Outubro de 2021 o então primeiro-ministro para o período de transição, Abdalla Hamdok, num golpe que fez descarrilar o processo de entrega do poder no país a uma liderança civil, que vinha a progredir aos solavancos desde o derrube do ditador Omar al-Bashir, numa revolta popular, em abril de 2019.
O golpe aconteceu semanas antes do prazo estabelecido para Al-Burhan entregar a Hamdok - um civil - a liderança do Conselho Soberano, o mais alto órgão executivo no Sudão no quadro do processo de transição, poucos meses antes da realização de eleições.
'Hemedti', que até ao início do conflito era vice-presidente do Conselho Soberano de Transição e aliado de Al-Burhan, explicou que a revolta levou a FAR a "reavaliar a sua posição" e "prosseguir o regresso ao caminho da transformação democrática, um caminho essencial para alcançar os objectivos designados na Carta das Nações Unidas".
"As forças armadas e os seus aliados do antigo regime [de al-Bashir] obstruíram os esforços para assegurar o êxito do processo político, que estava prestes a ser alcançado", lamentou Dagalo, sublinhando que "a hostilidade à mudança e à transição democrática" no seio da direção do exército levou al-Burhan a desencadear a guerra.
Neste sentido, Dagala sublinhou que o chefe do exército "perdeu a sua legitimidade após o golpe de 2021 e o colapso constitucional de [15 de] Abril", criticando a sua "fuga de Cartum para defender a guerra e falar ilegitimamente em nome do Sudão", numa referência à transferência de al-Burhan para Porto Sudão e às recentes deslocações internacionais para abordar o conflito, incluindo a viagem a Nova Iorque para participar na Assembleia Geral da ONU.
"Não tivemos outra escolha senão defendermo-nos e exercer os nossos direitos naturais e legítimos de defesa", sublinhou o líder das FAR, lamentando a "devastação" da capital devido à guerra e "a deslocação de milhares de pessoas inocentes nas regiões de Cartum e do Cordofão".
Dagalo acusou ainda al-Burhan de se aliar a grupos terroristas e manifestou "preocupação" com a "possibilidade de o Sudão se tornar um novo teatro de operações terroristas, o que poria em causa a paz e a segurança internacionais no continente".DSC