Pesquisando. PF Aguarde 👍🏽 ...

Namibe: Seca provoca escassez de “mahini ” no mercado

     Sociedade              
  • Namibe • Sábado, 29 Maio de 2021 | 11h35
1 / 2
Namibe: Jovem mucubal, Eduardo Mwabata, um dos produtores de leite "mahini"
Namibe: Jovem mucubal, Eduardo Mwabata, um dos produtores de leite "mahini"
Anabela Fritz
2 / 2
Mulheres mucubais vendem leite "mahini", no bairro Catoto, em Moçamedes
Mulheres mucubais vendem leite "mahini", no bairro Catoto, em Moçamedes
Anabela Fritz

Moçâmedes - A seca que devasta o sul de Angola, além do impacto causado na agricultura, tem reflexos nefastos na criação de gado, devido à falta de pasto e de água para os animais, que fornecem o leite para a produção do “mahini” (leite azedo), principal alimento da região.

Por Anabela Fritz

O “mahini”, alimento considerado bastante nutritivo, é extraído de manhã do primeiro leite da vaca. É consumido pela grande maioria da população da região sul, sobretudo por crianças entre os seis meses e os 12 anos de idade.

Nas refeições dos adultos, o “mahini” é acompanhado com funje de milho, massango, massambala, batata-doce (cozida ou assada) e outros alimentos, enquanto as crianças se limitam a tomar o leite.

Entre os grandes apreciadores deste nutriente tradicional estão os povos kubale, muimbas, makahonas, nyaneka humbi e mucubais (com maior incidência para estes últimos), mas outros povos residentes na região sul também o consomem.

Nessas comunidades tradicionais, é costume cada família possuir uma vaca ou cabra no curral, que constituem sinónimo de ostentação e de honra, também um recurso bastante valioso e sagrado, que simboliza uma reserva que só deve ser tocada em situação de extrema aflição, por constituir a sua principal riqueza.

Mesmo em caso de carência e necessidade, de fome extrema, recusam-se a vender o animal, por mais debilitado que esteja, na expectativa de que venha a recuperar e dele possam extrair o indispensável leite.  

Hoje, estes povos vivem um dos períodos mais difíceis da sua história, em consequência dos mais de quatro anos de seca na região.

Este estado crítico e desolador faz com que milhares de famílias, já por natureza nómadas, abandonem as suas zonas de origem, em busca de pasto para os animais, para evitar que cheguem a um estado tal de debilitação, que não consigam produzir leite para o “mahini”.

O leite azedo é, por si só, fonte de renda, na medida em que dele se extrai gordura, que é transformada num óleo, com o qual se produz o “ngundi”, um alimento com  características de um yougurte amanteigado.

O óleo é ainda usado pelas mulheres mucubais como creme corporal, conferindo à pele suavidade e brilho.

Processo de extracção do leite

De acordo com Eduardo Mbapachumuca, um criador de animais da etnia mucubal, a extracção do leite de vaca é um processo simples, mas que requer muita paciência.

“Ao amanhecer, tiramos os vitelos um a um para mamar um pouco (...) e, de seguida, começamos a tirar o leite”, explicou, adiantando que o produto é, depois, colocado num recipiente (cabaça) por mais de quatro horas, para azedar.

Depois de azedar, o leite permanece na cabaça por quase uma hora, formando uma camada superior com as características da manteiga, o chamado “ngundi”.  

Ao longo do processo, o leite é dividido em duas partes: uma para azedar e outra para consumo imediato.

“Entre Novembro e Abril, o leite azeda com facilidade devido às altas temperaturas que se registam nesta região, sobretudo no município do Virei. Como faz muito calor neste período, se formos mexendo, em menos de uma hora o leite está azedo”,  disse à ANGOP o jovem Eduardo Mbapachumuca.

Explicou que, para a comercialização do “mahini”, os produtores usam garrafas plásticas de diversos tamanhos, que expostas ao sol aceleram o processo de fermentação do leite.

Comercialização do “mahini”

Em Moçamedes, o “mahini” é comercializado ao preço de 700 kwanzas o litro, enquanto que no Virei, o maior produtor da província, um litro custa 500 kwanas.

Na capital do Namibe, o leite é comercializado nos “sambos” (lugares de concentração animal) e no quintalão do Catoto, área também conhecida como quintal dos mucubais, onde, todos os dias, povos desta etnia provenientes do município do Virei vendem o produto.

Também pode ser encontrado junto à ponte do Rio Bero e às salinas, onde há concentração de gado, ao passo que no Virei e na Bibala o leite é vendido nas paragens de autocarros e nos mercados municipais.

Em época de seca, o produto é escasso, porque, por falta de pasto e água, o gado não consegue produzir leite suficiente nem reproduzir-se.

Dada a escassez do produto, alguns vendedores, na ânsia de obter lucro fácil, adulteram o leite, adicionando-lhe água.

Principais consumidores

A partir dos anos 90, o leite azedo, que era unicamente consumido pelos povos mucubais, nyaneka ou hereros, passou a fazer parte da dieta alimentar da população do Namibe.

A convivência com pessoas provenientes da zona rural está na origem do consumo generalizado do produto, sem preconceito, sobretudo por  crianças e jovens desportistas, pelo seu valor nutritivo.

“Na minha casa consumimos o leite azedo com funje, pois é bastante apreciado pela família”, admitiu a jovem professora Madalena Camoco, aconselhando aos que olham para o produto com desdém para experimentá-lo.

Um outro jovem, Evaristo Joaquim, descendente da etnia mucubal e licenciado em Informática, também aconselha as pessoas a consumirem o leite.

“Este leite é melhor quando está fresco, principalmente para jovens desportistas depois de um treino, pois dá energia. Ele é tão nutritivo, que quando o tomamos, não queremos comer mais nada durante algumas horas”, garantiu a fonte, que, enquanto adolescente, produziu “mahini”.

Mayanguely Kamopotola, uma vendedora de origem mucubal, disse que os seus principais clientes são jovens que treinam na rua, revelando que consegue vender cinco litros de leite por dia.

Opinião de um nutricionista

Ernesto Dambuca, médico de clínica geral do Hospital Provincial Materno Infantil do Namibe, que lida com pacientes com má-nutrição, afirmou que a criança, após os primeiros seis meses de amamentação, pode alterar a sua dieta alimentar, usando outro tipo de leite, sem descurar o materno, que deve ser dado, se possível, até aos dois anos de idade.

Segundo o especialista, na eventualidade de se alterar o leite materno, nos casos em que a mãe não pode amamentar, é necessário o uso de outros leites artificiais, sendo o “mahini“ recomendável.

No entanto, advertiu que o mesmo pode apresentar riscos para a saúde humana se não for bem feito o processo de fermentação, ou seja, perante a inobservância das regras, desde a retirada do leite da vaca, sua colocação no recipiente e conservação.

Lembrou que o “mahini” pode ser consumido por crianças ou adultos, por ser “bastante rico em proteínas, principalmente enquanto fresco”.

O nutricionista aconselhou que as crianças, desde a tenra idade, devem consumir leite, para o fortalecimento dos ossos, um padrão que deve ser seguido até aos 12 anos de idade, pois é preciso cálcio e outros nutrientes.

Sublinhou que a má-nutrição, que se regista neste período de janeiro a Maio, além do fenómeno da seca, resulta das más condições sociais, sustentando que a maioria dos  casos registados no Hospital Provincial Materno Infantil do Namibe são de pessoas que vivem nas zonas urbanas.

De acordo Ernesto Dambuca, nos últimos três meses do ano em curso, este hospital registou mais de 20 doentes com má-nutrição.

“Milhares de famílias estavam habituados a fazer três refeições diárias e, hoje, apenas conseguem uma por dia, outras nenhuma, deixando muitos debilitados, surgindo assim a má-nutrição e outras doenças associadas, como a tuberculose e o VIH/Sida”, enfatizou.

O médico informou que para o melhor tratamento desta doença existe um protocolo entre o Ministério da Saúde e algumas organizações internacionais, como a Unicef e a Word VISION, que doam alguns suplementos como o “leite terapêutico", produto não industrializado e produzido única e exclusivamente para pessoas com má-nutrição.

Quando o hospital não dispõe deste suplemento, salientou, recorre a outras unidades, inclusive à vizinha província da Huíla, no âmbito de um intercâmbio existente.

Em 2020, o Hospital Provincial Materno Infantil do Namibe registou mil 947 casos de má-nutrição, 45 dos quais resultaram em óbito.

O médico exortou para a necessidade de se apostar numa campanha de educação alimentar, com vista a transmitir regras essenciais, para um acompanhamento nutricional, com informação sobre quantas vezes comer (por dia), o que comer e quando comer.

“A criança deve alimentar-se de produtos com fibras, cálcio, amido e outros que ajudam no seu crescimento e, na falta destes, pode-se substituir por outros naturais, produzidos localmente e em grandes quantidades, como a batata-doce, a mandioca, o milho, verduras e frutas”, recomendou nutricionista.





Fotos em destaque

Presidente Joe Biden visita Angola na primeira semana de Dezembro

Presidente Joe Biden visita Angola na primeira semana de Dezembro

 Quinta, 21 Novembro de 2024 | 12h47

Angolana Maria do Rosário Lima designada embaixadora do G20 Social

Angolana Maria do Rosário Lima designada embaixadora do G20 Social

 Quinta, 21 Novembro de 2024 | 12h43

Início de voos de passageiros no AIAAN marca história da aviação civil  angolana

Início de voos de passageiros no AIAAN marca história da aviação civil angolana

 Quinta, 21 Novembro de 2024 | 12h36

Criadores do Sul de Angola asseguram 80% na redução da importação de carne

Criadores do Sul de Angola asseguram 80% na redução da importação de carne

 Quinta, 21 Novembro de 2024 | 12h32

Aviação Civil angolana premiada pela excelência no Egipto

Aviação Civil angolana premiada pela excelência no Egipto

 Quinta, 21 Novembro de 2024 | 12h24

Angola beneficia de mais de 100 milhões USD para combater alterações climáticas 

Angola beneficia de mais de 100 milhões USD para combater alterações climáticas 

 Quinta, 21 Novembro de 2024 | 12h14

Brasileiros admitem possibilidade de Angola ser celeiro mundial

Brasileiros admitem possibilidade de Angola ser celeiro mundial

 Quinta, 21 Novembro de 2024 | 12h06

Serviços Prisionais aumentam área de produção agrícola no Cunene

Serviços Prisionais aumentam área de produção agrícola no Cunene

 Quinta, 21 Novembro de 2024 | 11h57


A pesquisar. PF Aguarde 👍🏽 ...
+