Abidjan – Angola e Côte d’Ivoire estabeleceram os seus primeiros acordos de cooperação político-diplomática, há cerca de quatro décadas, incluindo o Acordo Geral de Cooperação Económica e Científica, de Junho de 1985, assinado em Yamoussoukro, no país oeste-africano.
Por António Tavares, enviado especial da ANGOP
Passadas mais de quatro décadas, nada ou quase nada aconteceu para além das relações diplomáticas, alicerçadas na abertura de embaixadas, nos dois países, em 1984, e na assinatura do Acordo para o Estabelecimento de uma Comissão Bilateral de Cooperação.
Razões diversas impediram o estabelecimento de uma parceria estratégica profícua, vista hoje, pelas autoridades dos dois países com larga margem de progressão e com resultados positivos para ambos os povos.
Foi imbuídas deste espírito que as partes decidiram recorrer aos arquivos e lançar mão ao acordo de 2001 para, finalmente, em Abril deste ano, reactivarem a cooperação com a realização, em Luanda, da primeira sessão da Comissão Bilateral de Cooperação.
O encontro avaliou os projectos em curso entre os dois países, bem como procedeu à revisão dos acordos em vigor e os constrangimentos à materialização dos compromissos assumidos entre as partes.
Durante a reunião de Luanda, orientada pelos ministros das Relações Exteriores de Angola, Téte António, e dos Negócios Estrangeiros, da Integração Africana e Ivoirienses do Exterior, Léon Kacou Adom, foram assinados vários instrumentos para o reforço da cooperação em vários domínios.
Trata-se de protocolos que vão elevar o nível das relações nos sectores da Agricultura, Petróleo e Gás, Interior, Administração do Território, Turismo, Telecomunicações, Tecnologias de Informação e Comunicação Social, Saúde, Cultura, Ambiente, Ensino Superior e Educação.
De igual modo, abrangem a reestruturação do sistema da administração pública e os incentivos fiscais para o aumento do investimento estrangeiro em ambas economias num total de 17 instrumentos jurídicos.
Esses instrumentos deverão agora ser confirmados pelos Presidentes João Lourenço e Alassane Ouattara, durante a visita de 48 horas que o estadista angolano inicia, esta quinta-feira, em Abidjan, capital económica ivoiriense.
Agricultura e petróleo dominam cooperação
No reatamento da cooperação, um dos sectores de maior interesse para Angola é o da Agricultura.
A economia da Côte d’Ivoire é baseada na agricultura, que emprega 68% da população, principalmente no cultivo do cacau, sendo um dos maiores exportadores do mundo, com uma produção média anual de 1,335 milhão de toneladas.
O país é também o maior exportador de óleo de palma do mundo, o terceiro produtor de algodão, o primeiro produtor borracha de África e o quarto do mundo (83 mil toneladas ano), ao que se acresce as lavouras de abacaxi (30 mil toneladas), banana e açúcar, itens importantes da balança comercial.
Estes números demonstram a experiência dos ivoirenses na agricultura, um vector em alinhamento com a estratégia do Governo angolano em desenvolver e diversificar a economia, excessivamente dependente do petróleo.
Para o efeito, o Governo de Angola, através do Ministério da Agricultura e Florestas, está a analisar um conjunto de modelos agrícolas da Côte d'Ivoire para implementar no território nacional.
Foi com este objectivo que, em Fevereiro deste ano, o secretário de Estado angolano da Agricultura e Pecuária, João Bartolomeu Cunha, visitou este país da África Ocidental, para avaliar os sistemas relacionados com as culturas de café, palmar e cacau.
Na ocasião, João Bartolomeu Cunha visitou o Centro de Investigação Agrária, especializado na cultura e multiplicação de mudas de café, palmar e cacau, assim sectores agrícolas e industriais ligados à plantação, produção, industrialização e comercialização desses produtos.
As equipas técnicas de ambos os países delinearam os sectores de interesse mútuo, susceptíveis de inclusão no projecto documental para a assinatura, a posterior, de acordos de cooperação nos domínios referenciados.
Na altura, esta ideia foi defendida pelo presidente da Associação Industrial de Angola (AlA), José Severino, para quem o Executivo angolano deve apostar numa cooperação 'intensa' entre Angola e a Côte d'Ivoire.
Para promover a livre circulação de pessoas e bens, Luanda e Abidjan falam também na abertura da ligação área entre as duas capitais, através das companhias aéreas (TAAG e Air Côte d'Ivoire), para estimular a cooperação entre a classe empresarial dos dois países.
De Angola, a Côte d’Ivoire quer aproveitar a sua experiência no domínio da exploração de petróleo e gás, com a descoberta de grandes quantidades destes recursos.
Recentemente, surgiram indicadores de crescimento potencial no sector do petróleo e do gás da nação oeste-africana, com especialistas a estimar que o país se tornará num dos 10 maiores produtores de petróleo, em África, até 2027.
Um grande campo petrolífero foi descoberto na plataforma da Côte d’ivoire, nas águas do Golfo da Guiné, cujas reservas são estimadas em 1,5 a 2 mil milhões de barris de petróleo e até 2,4 triliões de pés cúbicos (cerca de 67 mil milhões de metros cúbicos) de gás natural.
Angola é dos principais produtores de petróleo de África e as autoridade divulgaram, recentemente, que o país tem um potencial de aproximadamente 50 mil milhões de barris de petróleo por explorar, dos quais perto de 10 mil milhões já descobertos.
O aumento de 32 para 50 blocos de exploração de petróleo e gás, até 2025, constitui uma das metas da Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustível, com vista ao reforço da produção petrolífera, em Angola.
Segundo a ANPG, a produção de petróleo de Angola, em Abril último, foi de 32 milhões 206 mil e 719 barris, correspondendo a uma média diária de um milhão 73 mil e 557 barris de petróleo, contra um milhão 129 mil e 395 barris previsto.
Interessa Angola aprofundar a cooperação no domínio do Petróleo e seus derivados, bem como clarificar o futuro da sua participação na Sociedade Ivoiriense de Refinação (SIR), que se situa na ordem dos 20%.
A Côte d'Ivoire tem um rendimento per capita relativamente elevado (1.662 dólares em 2017) e desempenha um papel fundamental no comércio de trânsito para os países vizinhos sem litoral.
O país é a maior economia da União Económica e Monetária da África Ocidental, constituindo 40% do PIB total da união monetária e é também o quarto maior exportador de bens gerais da África Subsariana (depois da África do Sul, da Nigéria e de Angola) e maior exportador mundial de cacau.
No domínio da Saúde, Angola quer beneficiar da experiência adquirida por este país e que detém um Centro de Cardiologia dos poucos existentes, em África.
Depois de um longo período de concertação nos variados níveis, as autoridades de Angola e Cotê d'Ivoire entendem estarem criadas as condições para o lançamento da sua cooperação económica.
Por isso, para além de testemunhar a assinatura dos acordos, o Presidente João Lourenço vai visitar indústrias estratégicas deste país francófono.
Está igualmente prevista a realização de um fórum empresarial, em que estarão cerca de 20 empresários angolanos dos diversos ramos de actividade. ART/IZ