Luanda - O Governo angolano entregou, esta quarta-feira, as ossadas de Alves Bernardo Baptista "Nito Alves", Jacob João Caetano "Monstro Imortal", Arsénio José Lourenço 'Siyanouk' e de Ilídio Ramalhete, vítimas dos acontecimentos de 27 de Maio de 1977.
A entrega das ossadas aconteceu no Quartel-General do Exército (Ex-RI20), na presença de familiares das vítimas, de membros da Comissão de Reconciliação em Memória das Vítimas dos Conflitos Políticos (CIVICOP), da Fundação 27 de Maio, de igrejas e da sociedade civil.
O coordenador da CIVICOP e ministro da Justiça e dos Direitos Humanos, Francisco Queiroz, considerou o momento como de grande significado para a reconciliação nacional, perdão e pacificação dos espíritos.
"Com este acto, não se pretende apagar a história dos tristes acontecimentos do 27 de Maio, pretende-se, sim, cumprir um dever de justiça para com as famílias e prestar uma merecida homenagem aos que tombaram naquele conflito político", exprimiu.
No discurso proferido à Nação, no dia 26 de Maio de 2021, o Presidente João Lourenço, em nome do Estado angolano, pediu desculpas públicas e o perdão "pelo grande mal que foram as execuções sumárias do 27 de Maio e naquelas circunstâncias".
Segundo o ministro Francisco Queiroz, esse acto de humanismo do Titular do Poder Executivo e de respeito pelas famílias não se resumiu a simples palavras.
Notou que o Presidente João Lourenço reflectiu o sincero arrependimento e vontade de pôr fim à angústia que, ao longo destes 45 anos, as famílias carregam consigo, por falta de informação sobre o destino dado aos seus ente queridos.
"Cumprindo essa promessa, eis-nos aqui hoje a honrar a memória de quatro vítimas de conflitos políticos, entregando às respectivas famílias as suas ossadas para que possam realizar com dignidade os funerais a que têm direito", assinalou.
Lembrou que no cumprimento dessa missão e sob orientação do Chefe de Estado, a CIVICOP iniciou um longo caminho de aproximação dos irmãos desavindos, num processo de diálogo frontal e sincero.
Sublinhou que esse processo criou um clima de confiança e de quebra de tabus, que culmina agora com a localização e devolução às famílias dos corpos de cidadãos angolanos tombados por ocasião do infausto acontecimento de 27 de Maio.
O ministro disse que foi necessário observar e cumprir procedimentos meticulosos cientificamente rigorosos, de acordo com as regras universalmente aceites para a localização de sepulturas, exumação de ossadas e realização de análises genéticas, para determinar o DNA e comparação com o mesmo tipo de exame ao material genético fornecido pelas famílias.
O ministro esclareceu que o processo cumpriu com as regras da ciência forense e permitiu determinar com a margem de certeza e o exame de DNA, que os ossos depositados nas quatro urnas pertencem a Nito Alves, Monstro Imortal, Siyanouk e Ramalhete.
Juntamente com as suas ossadas, foram entregues às famílias os relatórios dos exames genéticos das perícias de antropologia forense e dos estudos de DNA realizados aos ossos e as amostras fornecidas por essas mesmas famílias.
Famílias agradecem gesto do Presidente da República
Alves do Amaral, sobrinho de Nito Alves, considerou de humanismo o gesto do Presidente João Lourenço ao pedir perderão e facilitar o processo de devolução das ossadas das vítimas dos conflitos políticos, para que os familiares realizassem um funeral condigno aos seus ente queridos.
Lembrou que o seu tio Nito Alves, não só integrou, como abraçou a ideologia do nacionalismo angolano, feito também abraçado pelos seus progenitores e dos seus familiares oriundos da ex-primeira região Militar do MPLA (Dembos).
"Este calvário termina depois de 45 anos e, por isso, estão também perdoados os que estiveram envolvidos na morte de Nito Alves", assegurou.
Já Yura Mesquita, filha de Arsênio Lourenço (Siyanouk), notou que o momento não é para procurar culpados, mas de reconciliação, agradecendo também o gesto do Presidente João Lourenço pela sua entrega neste processo.
"O acto tem um atraso de 45 anos, mas ainda assim nos alegra e, como os outros, repito: muito obrigado Senhor Presidente João Lourenço, por ter tido a iniciativa (...)", expressou.
Idêntico gesto foi expressado por Ginga Afonso Miguel, familiar de Monstro Imortal, lembrando que o nome que ostenta lhe foi dado pelo malogrado nacionalista.
Criada por Decreto Presidencial, em Abril de 2019, a Comissão de Reconciliação em Memória das Vítimas dos Conflitos Políticos (CIVICOP), tem por missão elaborar um plano geral de homenagem às vítimas dos conflitos políticos ocorridos em Angola, no período de 11 de Novembro de 1975 a 4 de Abril de 2002.
A CIVICOP é presidida pelo ministro da Justiça e dos Direitos Humanas, Francisco Queiroz, e integra representantes de vários departamentos ministeriais, como o da Defesa, Interior, Saúde, Telecomunicações Tecnologias de Informação e Comunicação Social.