Carlos Feijó discorda de acórdão do TC

     Política           
  • Luanda     Sexta, 13 Agosto De 2021    10h31  
Constitucionalista Carlos Feijó (arquivo)
Constitucionalista Carlos Feijó (arquivo)
Alberto Julião

Luanda - O constitucionalista angolano Carlos Feijó considerou, quinta-feira, em Luanda, "inconstitucional o acórdão do Tribunal Constitucional (TC)" relativo ao processo de fiscalização preventiva à Proposta de Revisão da Lei Magna, remetida pelo Presidente João Lourenço.

Em entrevista à TV Zimbo, o também professor universitário fundamentou que o acórdão 688/2021 "viola os princípios limitativos e da congruência que devem imperar na actuação" deste tribunal.

Esta semana, os juízes do TC devolveram o texto ao Presidente da República, declarando que a Proposta de Lei aprovada pelo Parlamento "está conforme os princípios e limites fixados nos artigos 232°, 234°, 235° e 237° da Constituição da República de Angola (CRA), excepto as alíneas 5 do artigo 181°, 4 do art. 182°, 4 do art. 183° e 6 do 184°, por "desrespeitarem os limites materiais na Lei Magna".

No seu acórdão, os juízes do TC sugerem que a respectiva Proposta de Lei volte ao legislador material (Parlamento), a fim de serem expurgados esses artigos.

No entender do constitucionalista, em obediência aos princípios da auto limitação, a instituição, em sede de fiscalização preventiva, devia limitar-se a matérias "jurisdicionais, e evitar a justicialidade" de questões políticas.

Acusou o tribunal de abusar, também, do princípio da não controlabilidade ao poder legislativo, pelo facto de não ter competência para decidir o mérito ou demérito das opções políticas do legislador e de violar o princípio da congruência, ao ter ido para além da matéria pedida.

Perante uma decisão inconstitucional do Tribunal Constitucional, não havendo outra instituição de recurso, disse que o Presidente da República deve remeter o documento à Assembleia Nacional (AN), que detém o poder legislativo para expurgar o que é considerado inconstitucional.

Manutenção da norma pela Assembleia Nacional

Sublinhou que, se fosse deputado, manteria a norma, tendo acrescentado que a Assembleia Nacional tem o poder de manter a norma como a aprovou, porque o Tribunal Constitucional é um órgão passivo e não pode tomar a iniciativa para reapreciar as alterações da Constituição.

Questionado sobre as razões da incongruência de um órgão com a responsabilidade de fiscalizar sobre a Constituição, respondeu que os tribunais têm legitimidade argumentativa das decisões, enquanto o poder legislativo tem legitimidade popular.

O coordenador da comissão técnica que elaborou a CRA de 2010, qualificou como sem fundamento o TC considerar inconstitucional a obrigatoriedade de prestar conta à Assembleia Nacional, porquanto existe a teoria da responsabilidade pública pelo exercício da função soberana do Estado.

O antigo chefe da Casa Civil do Presidente da República esclareceu que na prestação de contas, expressa na Proposta de Revisão pontual da Constituição, não se viola o princípio da separação de poderes, porque num regime democrático nenhum órgão de soberania fica sem controlo público da Assembleia Nacional, que representa o povo.

O que se pretende é um relatório sobre o estado da justiça e não das decisões judiciais em concreto, clarificou, na sua entrevista à TV Zimbo.

Segundo Carlos Feijó, o atraso à resposta relativa à fiscalização preventiva da revisão constitucional pelo TC devia resultar em responsabilização civil e pública, alertando que o acto pode retardar o processo de preparação eleitoral e da logística necessária ao pleito.

Aprovação da lei eleitoral sem conclusão da revisão constitucional

Abriu um parêntesis para considerar bizarro o facto de a Assembleia Nacional ter aprovado a lei eleitoral sem a conclusão do processo de revisão constitucional, lembrando que o poder legislativo primário é da AN. "Não existindo obrigação legal de consulta, e caso o faça não é vinculativa", sustentou.

O constitucionalista declarou não existir relação de hierarquia entre os tribunais superiores, mesmo que o Constitucional tenha o poder de rebater as decisões de outros tribunais.

De acordo com Carlos Feijó, a magistratura é uma carreira técnica, na qual se avalia o desempenho, enquanto na carreira política o candidato depende da aceitação popular nas urnas, que o legitima.

Quanto à renúncia do presidente do Tribunal Constitucional, afirmou que era previsível, por, segundo o constitucionalista, dificuldades que tinha em criar consensos, sublinhando que no lugar dele já se teria demitido há um ano.

Manuel Aragão manifestou, quinta-feira, ao Presidente da República o desejo de cessar as funções de presidente do Tribunal Constitucional, pedido aceite por João Lourenço.

Manuel Aragão fez o pedido dois dias depois de ter votado contra a Revisão Parcial da Constituição, argumentando haver retrocessos em algumas matérias sobre a separação de poderes.

Votos vencidos a Manuel Aragão

Na óptica de Carlos Feijó, os votos vencidos reiterados do presidente cessante do Tribunal Constitucional demonstrava estar em contra ponto com a maioria que liderava, dando a impressão de grande instabilidade na instituição.

Para o constitucionalista, a renuncia ao cargo pode coartar a jubilação de Manuel Aragão pelo TC, embora seja já pelo Tribunal Supremo.

Sobre o ensino superior em Angola, Carlos Feijó entende que "vai de mal a pior", por, na sua visão, não se respeitar os princípios da autonomia científica e da liberdade académica.

A seu ver, a Faculdade de Direito da universidade publica está transformada num "liceu grande", escusando-se a continuar a abordar o assunto, alegando reserva a seu direito ao silêncio.

Questionado sobre o silêncio que se auto impôs em relação à imprensa, disse haver "tempo para falar, tempo para ficar calado e tempo para falar calado".

Proposta de revisão parcial da Constituição

A Assembleia Nacional aprovou, a 22 Junho último, com uma maioria qualificada de 152 votos a favor, nenhum contra e 56 abstenções, a primeira revisão ordinária parcial da Constituição, 11 anos depois da sua entrada em vigor, a 5 de Fevereiro de 2010.

Entre outras questões, a revisão esclarece as dificuldades de interpretação que havia, sobre a fiscalização do Executivo pela AN, e assegura o exercício de voto aos cidadãos angolanos residentes no exterior, assim como retira da actual Constituição o gradualismo na implementação das autarquias.

As alterações aprovadas abrangem, igualmente, a estrutura de posicionamento de instituições, como o Banco Nacional de Angola (BNA), que passa a ter estatuto constitucional e uma nova forma de designação do seu governador.

Com a revisão, agora validada, a Constituição passará a ter 249 artigos, contra os actuais 244, sendo que foram alterados 44 e incluídos sete novos.

A Constituição atribui ao Presidente da República e a um terço dos 220 deputados da Assembleia Nacional, em efectividade de funções, a iniciativa de revisão constitucional.

A revisão constitucional em curso é uma iniciativa do Presidente da República, João Lourenço.

 





Fotos em destaque

SODIAM arrecada USD 17 milhões em leilão de diamantes

SODIAM arrecada USD 17 milhões em leilão de diamantes

Sábado, 20 Abril De 2024   12h56

Fazenda colhe mil toneladas de semente de milho melhorada na Huíla

Fazenda colhe mil toneladas de semente de milho melhorada na Huíla

Sábado, 20 Abril De 2024   12h48

Huambo com 591 áreas livres da contaminação de minas

Huambo com 591 áreas livres da contaminação de minas

Sábado, 20 Abril De 2024   12h44

Cunene com 44 monumentos e sítios históricos por classificar

Cunene com 44 monumentos e sítios históricos por classificar

Sábado, 20 Abril De 2024   12h41

Comuna do Terreiro (Cuanza-Norte) conta com orçamento próprio

Comuna do Terreiro (Cuanza-Norte) conta com orçamento próprio

Sábado, 20 Abril De 2024   12h23

Exploração ilegal de madeira Mussivi considerada “muito crítica”

Exploração ilegal de madeira Mussivi considerada “muito crítica”

Sábado, 20 Abril De 2024   12h19

Hospital de Cabinda realiza mais de três mil cirurgias de média e alta complexidade

Hospital de Cabinda realiza mais de três mil cirurgias de média e alta complexidade

Sábado, 20 Abril De 2024   12h16

Camacupa celebra 55 anos focado no desenvolvimento socioeconómico

Camacupa celebra 55 anos focado no desenvolvimento socioeconómico

Sábado, 20 Abril De 2024   12h10

Projecto "MOSAP 3" forma extensionistas para escolas de campo em todo país

Projecto "MOSAP 3" forma extensionistas para escolas de campo em todo país

Sábado, 20 Abril De 2024   12h05

Comunidade do Lifune (Bengo) beneficia de biofiltros

Comunidade do Lifune (Bengo) beneficia de biofiltros

Sábado, 20 Abril De 2024   11h58


+