Paris - Vários colectivos de imigrantes indocumentados em França ameaçaram esta terça-feira convocar uma greve contra o endurecimento pelo Governo das condições de regularização, se as suas próximas manifestações não tiverem efeito.
"Ainda não chegámos a esse ponto, mas dada a situação em que nos encontramos, talvez tenhamos de organizar uma greve", afirmou Anthioumane Touré, representante do grupo que reúne os colectivos de trabalhadores indocumentados, numa conferência de imprensa em Paris, noticia agência Lusa.
Os sete grupos de imigrantes indocumentados da região de Paris, apoiados por várias organizações não-governamentais (ONG) e sindicatos, afirmaram estar "preparados" para entrar em greve se as acções que têm planeadas para as próximas semanas não levarem o Governo de François Bayrou a rever a sua última circular sobre a imigração.
"Contribuímos para que as coisas funcionem no país", disse Anthiouman Touré, acrescentando que se estes trabalhadores pararem "um só dia", a economia francesa será afectada, dado o seu grande peso nos sectores da restauração, da construção, da logística e dos cuidados pessoais.
Na semana passada, o ministro do Interior francês, o conservador Bruno Retailleau, endureceu consideravelmente as condições para a regularização dos imigrantes em situação irregular, limitando-a e concentrando-a nos empregos com grandes dificuldades em encontrar mão-de-obra.
Os imigrantes representam cerca de 10% da população francesa de 68,6 milhões de habitantes, incluindo os indocumentados, cujo número, de acordo com as estimativas, varia entre 300.000 e 600.000.
"Não somos ladrões, somos pessoas que vieram trabalhar", afirmou Mariama Sibidé, com cerca de 50 anos, membro do mesmo grupo, acrescentando que estão "prontos", se necessário, para uma greve.
Outro dos porta-vozes do grupo, Abderrahmane Sidibé, criticou a forma como grande parte dos meios de comunicação social e dos políticos franceses retratam os imigrantes, aludindo às declarações do primeiro-ministro centrista, nomeado a 13 de Dezembro de 2024, que na segunda-feira afirmou que a França se aproxima de uma "submersão migratória".
"A maioria de nós trabalha porque sem trabalho não temos nada. Dedicamo-nos a empregos mais difíceis, duros, por vezes temos de trabalhar com os documentos de outras pessoas. A lei Darmanin (promulgada há um ano pelo antigo ministro do Interior) e a circular Retailleau abrem caminho a uma espécie de escravatura moderna", defendeu Sidibé.
Entre as dezenas de ONGs que participaram no evento em Paris, Camila Ríos Armas, exilada venezuelana e fundadora da UniR, que ajuda refugiados e requerentes de asilo, criticou a atitude das autoridades francesas em relação aos activistas que ajudam os imigrantes.
"Estamos num ambiente em que, de certa forma, as pessoas que defendem os direitos humanos são criminalizadas. Isto acontece em países com democracias fracas ou em ditaduras. Tudo isto leva-nos a perguntar em que estado se encontra a democracia francesa", afirmou a activista.
Outras organizações presentes, incluindo o sindicato Solidaires, criticaram o Estado francês por dar um mau exemplo, uma vez que foi condenado em várias ocasiões pela justiça europeia por não cumprir as suas obrigações para com os requerentes de asilo. AM