A influência de Chakaya na preservação da música angolana

     Cultura              
  • Luanda • Terça, 17 Setembro de 2024 | 19h20
Augusto Chacaya
Augusto Chacaya
DR

Luanda - A música angolana acaba de perder uma das suas figuras mais carismáticas, Augusto Chakaya, membro do agrupamento Jovens do Prenda, cujo legado permanece vivo nas melodias, nas palavras e na essência de quem ele foi.

Por Miguel Leazar, consultor e investigador cultural 

Chakaya não foi apenas um músico, foi um verdadeiro intérprete, que soube trazer as histórias e ensinamentos do povo para o palco, embalado pelo semba. 

O contributo do artista e dos "Jovitos" vai muito além da música, sendo que, nas suas composições, encontram-se profundas lições de vida, carregadas de sabedoria popular.

Chakaya e o seu conjunto foram guardiões da alma angolana e da língua kimbundo, além de preservadores fiéis da nossa identidade cultural, em tempos difíceis. 

Com Augusto, os Jovens do Prenda consolidaram-se como um pilar de resistência cultural, demonstrando que a música não é só entretenimento, mas uma ferramenta de educação e preservação da história de um povo.

O músico usou a arte para manifestar as suas angústias, mas também as vitórias e regozijos, sendo, por isso, uma referência incontornável da história do cancioneiro popular e urbano angolano do pós-independência. 

Nas suas ricas e envolventes composições, o artista expressou as suas dores pessoais, como se pode sentir na tocante e emotiva homenagem feita à filha Sandra. 

Com a alma de um pai em luto, ele cantou: "Oh meu Deus, a morte não escolhe pessoa, desta vez leva minha querida filha, Sandra. Assim que estou a cantar, vejo-a e chamo-a, minha filha vem, minha filha do coração... Maldita morte!"

Esta canção não era apenas uma homenagem, mas um grito de desespero diante da injustiça e implacabilidade da morte.

Chakaya abordava temas do quotidiano como a luta contra o alcoolismo, bem patente em uma das suas canções em que dizia: "Que homem és tu que bebes todos os dias? Que homem és tu, corrido do serviço por causa da bebida? Meu Deus, desgraça és tu, mulher, me dás uma cabra como filha". 

Essas e outras letras, que demonstraram a sua veia compositora, são uma crítica directa aos desafios das famílias e reflectem, especialmente, o impacto do vício.

Outra de suas mensagens fortes foi dirigida à mulher chamada Manuela, com quem ele cantava: "Não seja ingrata, Manuela, és muita vaidosa. Tens maus hábitos, mas, se tens coração, põe a mão na cabeça e pensa no bem que te fiz. Hoje tem moda nova de tranças e roupa e me esqueces".

A letra reflete a decepção e a raiva pela ingratidão de quem ele tanto ajudou, demonstrando a sua capacidade de traduzir emoções humanas profundas em música.

Em suas canções, Chakaya também buscava respostas espirituais e tradicionais. Em outra composição poderosa, ele clama à esposa para leva-lo a sua mãe, no campo, dizendo: "Samba, leva-me à minha mãe, no tradicional ela saberá a cura. Me rogaram praga e não sei qual foi o pecado que cometi. Se fico aqui, vou morrer, eu não quero, penso imenso nos meus filhos que ainda são crianças".

Portanto, a música não era apenas entretenimento, mas um canal para as questões espirituais e sociais, que o artista soube explorar com mestria e amor, nos palcos e fora deles.

Augusto Chakaya também era um grande criador de slogans marcantes, como "Com os Jovitos, Quem procura acha e Quem ajuda é ajudado". As suas palavras não eram apenas ditas, mas vividas, reflectindo a sabedoria popular angolana e a sua profunda conexão com o povo. 

Outro dos seus dizeres marcantes, “O intriguista é como o carvão, se não queima, suja” é uma autêntica lição que ressoará por gerações, assim como “A inveja é a arma dos incompetentes,” que usava para nos lembrar do valor da humildade e do trabalho honesto. 

Na verdade, o músico foi uma força criativa incansável, que misturava palavras e sons com uma autenticidade que reflectia a vida angolana em todos os seus aspectos.

Além das suas letras, Chakaya era conhecido pela sua Banga Fukula, sempre a rigor nos palcos com os seus 

fatos multicoloridos, do vermelho ao verde alface. 

As suas "roupas de saída" eram uma extensão da sua personalidade vibrante, elevando cada performance a um espectáculo único, tanto visual quanto musical.

 

Por tudo isso, podemos afirmar que Angola perde um grande ícone, uma voz que nos conectava diretamente às nossas raízes e à nossa essência musical. 

Ainda assim, o seu legado está longe de desaparecer. 

Cada uma das suas performances, os slogans que inventava e o seu estilo singular continuarão a ecoar na memória de quem teve o privilégio de testemunhar o seu brilho. 

Chakaya cumpriu com mestria a sua missão: deixar uma marca indelével na história da música e da cultura angolana.

Que a sua alma descanse em paz, sabendo que a sua música e o seu espírito viverão para sempre nos corações de todos os que celebram a arte e a cultura de Angola.





Fotos em destaque

Prevenção de acidentes rodoviários vence prémio da feira tecnológica

Prevenção de acidentes rodoviários vence prémio da feira tecnológica

 Terça, 17 Setembro de 2024 | 12h04

Mais de quatrocentos reclusos frequentam ano lectivo no Bentiaba (Namibe)

Mais de quatrocentos reclusos frequentam ano lectivo no Bentiaba (Namibe)

 Terça, 17 Setembro de 2024 | 12h01

Angola sem registo de casos da varíola dos macacos

Angola sem registo de casos da varíola dos macacos

 Terça, 17 Setembro de 2024 | 11h54

Divisão das Lundas fruto da estratégica de Agostinho Neto

Divisão das Lundas fruto da estratégica de Agostinho Neto

 Terça, 17 Setembro de 2024 | 11h50

Merenda Escolar chega a mais de três mil crianças dos Gambos (Huila)

Merenda Escolar chega a mais de três mil crianças dos Gambos (Huila)

 Terça, 17 Setembro de 2024 | 11h45

Nhakatolo Ngambo torna-se na 6ª rainha do povo Luvale

Nhakatolo Ngambo torna-se na 6ª rainha do povo Luvale

 Terça, 17 Setembro de 2024 | 11h41

Parques nacionais de Mavinga e Luengue-Luiana com mais de 10 mil elefantes

Parques nacionais de Mavinga e Luengue-Luiana com mais de 10 mil elefantes

 Terça, 17 Setembro de 2024 | 11h37

Angola produz óleo alimentar acima de cem por cento

Angola produz óleo alimentar acima de cem por cento

 Terça, 17 Setembro de 2024 | 11h34


+