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Desafios e oportunidades da iniciação autárquica no limiar dos 50 anos de independência

Mapa de Angola
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Angop

Luanda – Angola tem vindo a preparar-se, nos últimos tempos, para viver a maior reforma administrativa desde o alcance da sua Independência, a 11 de Novembro 1975, com a implementação do processo das autarquias locais.

Por António Tavares, jornalista da ANGOP

Numa altura em que o país assinala 49 anos de independência, as autarquias locais apresentam-se, como uma nova proposta de governação em Angola, assente numa administração descentralizada.

A sua institucionalização é dos assuntos mais comentados e discutidos nos últimos anos nos meios políticos, académicos e da sociedade civil, tendo tomado outros contornos com a criação de um serie de condições materiais e legislativas para a sua materialização.

Trata-se de uma mudança prevista no artigo 213.º da Constituição da República de Angola, segundo o qual a organização democrática do Estado estrutura-se com base no princípio da descentralização político-administrativa, que compreende a existência de formas organizativas do poder local, dentre elas as autarquias locais.

A descentralização implica a acumulação e partilha de poderes do Governo Central com o Governo local, ou seja, no plano jurídico, diz-se que é o sistema em que a função administrativa está confiada não apenas ao Estado, mas também a outras pessoas colectivas territoriais, designadamente as autarquias.

No plano político-administrativo, há descentralização quando os órgãos das autarquias são livremente eleitos pelas respectivas populações, sendo independentes quanto às suas atribuições e competências, apesar de sujeitos a formas atenuadas de tutela administrativa, em regra restritas ao controlo da legalidade.

Porém, em termos gerais, pode dizer-se que o processo implica a limitação do Governo Central e o aparecimento de entes políticos locais, legitimados pelas eleições autárquicas, bem como, consequentemente, a melhoria da eficiência, governação, equidade e redução da pobreza.

A descentralização do poder contribui para o desenvolvimento de qualquer país, se criadas as condições necessárias para a sua efectiva implementação, sendo esse o principal desafio do Executivo angolano.

Desafios

Realidades parecidas com as de Angola apontam que muitos são os desafios a enfrentar para que haja um processo de implementação das autarquias, eficiente e capaz de apresentar resultados satisfatórios que possam contribuir para o desenvolvimento local e global do país.

Os vários desafios que o país precisa de enfrentar para o sucesso das autarquias passam pelos aspectos geográficos, institucionais e pelo seu nível de desenvolvimento.

Outros aspectos a ter-se em conta para a sua implementação com êxito têm a ver  com o grau de urbanização, tipo de infra-estruturas técnicas e administrativas existentes, a base económica de cada município, densidade populacional, disponibilidade de estruturas jurídico-administrativas e vias de acesso e de comunicação, para se constituírem autarquias que sirvam as populações, já que a vida deve fazer-se nos respectivos municípios.

A Constituição da República de Angola consagra um modelo de Governo da autarquia assente em três instituições, sendo uma assembleia dotada de poderes deliberativos, um órgão executivo colegial e um presidente da autarquia.

Vantagens e desvantagens da implementação das autarquias

Este sistema será precursor de um conjunto de vantagens e desvantagens, tanto para a população quanto para o Governo Central.

Algumas das vantagens podem ser, nomeadamente, a desburocratização da gestão pública e dos serviços públicos, maior proximidade entre os cidadãos e o Executivo, mais autonomia entre os municípios e maior participação da população na tomada de decisões.

Inscreve-se, também, um maior controlo da arrecadação de receitas do município, eficiência na resolução de problemas urgentes nos municípios, melhoria dos acessos aos serviços de saúde, educação, entre outros.

Relativamente às desvantagens, basicamente se centram na possibilidade de descoordenação do exercício das funções autárquicas e no mau uso dos poderes limitados à autarquia por parte de pessoas (os autarcas) nem sempre bem preparadas para os exercer.

Transferência de competências

O processo da implementação das autarquias passa pelo reforço da descentralização do poder administrativo, bem como pela transferência de competências, recursos humanos e financeiros para os municípios.

No pacote que regula o processo de institucionalização das autarquias, existe a proposta de Lei da Transferência de Atribuições e Competências do Estado para as Autarquias Locais, que prevê a transferência progressiva das atribuições dos poderes da administração central para as autarquias e inclui a transferência dos recursos fixados anualmente pelo Orçamento Geral do Estado.

Para além da transferência das competências da administração para as autarquias, o sistema central e as diferentes autarquias podem ainda estabelecer parcerias, sendo que as tarefas que não forem atribuídas às autarquias são de inteira responsabilidade do Estado.

As competências a serem transferidas do Estado para as autarquias abrangem diversos domínios como saúde, educação, energia, água, lazer, habitação, acção social, desporto, protecção civil, património, cultura, ciência, promoção do desenvolvimento, entre outros.

As autarquias serão organizadas pelos seus órgãos representativos, que compreendem a Assembleia Municipal, a Câmara Municipal e o presidente da Câmara Municipal, que serão eleitos a cada cinco anos.

PIIM concorre para implementação das autarquias

O Estado tem alicerçado as bases para a implementação das autarquias através do Plano Integrado de Intervenção nos Municípios (PIIM), que visa identificar as principais necessidades dos municípios, de forma a solucionar os problemas prioritários destas novas estruturas.

Há todo um trabalho de base a ser feito antes da realização das eleições autárquicas, e uma das premissas que integram as acções do PIIM, lançado em 2019, na província do Moxico, e em execução em todo o país, tem a ver com a construção de infra-estruturas administrativas autárquicas, para albergar os seus serviços.

A carteira do PIIM é de mais de dois mil projectos, integrando a construção e reabilitação de estradas, escolas, hospitais, redes de distribuição de água e de energia eléctrica, complexos residenciais, entre outros, que garantem a disponibilidade de serviços básicos aos cidadãos e maior desenvolvimento das comunidades.

Até ao final deste ano, 500 projectos do PIIM estarão concluídos e ao serviço da população. Com estes novos projectos, a carteira do PIIM concluída será de mais de dois mil projectos.

Assembleias autárquicas

O Executivo compreende que as carências em infra-estruturas para as futuras autarquias devem ser resolvidas.

Por isso, sabendo que uma das principais dificuldades vividas por vários municípios é a colocação de quadros no seu território, sobretudo nas localidades mais recônditas, está em curso a construção de complexos residenciais em 36 municípios, bem como 35 assembleias para as autarquias.

 ENAPP preparada para a formação de quadros

O modelo de gestão das autarquias obriga a capacitação multidisciplinar dos gestores, técnicos e futuros eleitos autárquicos, desafio para o qual a Escola Nacional de Administração de Políticas Públicas diz estar preparada (ENAPP).

A instituição está preparada para capacitar os quadros, de modo a tornar as futuras regiões autárquicas eficientes na prestação dos serviços públicos.

O ENAPP tem um conjunto de acções formativas destinadas aos órgãos da administração pública local e central, sendo algumas obrigatórias e outras opcionais que se adequam às autarquias.

Em sede do processo de preparação para a implementação das autarquias, várias acções já foram feitas, visto que há uma dimensão do capital humano e não se consegue chegar à excelência sem capacitar o homem.

Condições legislativas

Porém, a convocação das eleições autárquicas, um poder atribuído pela Constituição ao Presidente da República, está condicionada à aprovação da Lei de Institucionalização destas estruturas pela Assembleia Nacional.

O Parlamento tem à mesa duas propostas, do MPLA e da UNITA, que deverão ser conformadas nos debates na especialidade, constituindo-se numa das principais agendas no presente ano legislativo.

Este diploma já havia entrado no Parlamento na legislatura anterior, quando foi aprovado apenas na generalidade, tendo caducado por força do regimento e costume parlamentar. 

A discussão em torno da implementação gradual ou não das autarquias impediu que se encontrasse consenso.

No entanto, a revisão da Constituição da República, em 2022, revogou o nº 1 do artigo 242, sobre a implementação gradual das autarquias locais

A proposta de Lei sobre a Institucionalização das Autarquias Locais visa estabelecer as normas sobre a criação desses entes do poder local, assim como as medidas de transição entre a administração local do Estado e a administração autárquica.

O Pacote Legislativo Autárquico conta já com 12 dos 13 instrumentos jurídicos que vão regular o exercício do poder autárquico no país, no quadro do projecto de implementação das autarquias em curso.

Trata-se da Lei dos Símbolos das Autarquias Locais, Lei Orgânica que Aprova o Estatuto dos Eleitos Locais, Lei sobre os Actos e Formulários dos Órgãos das Autarquias Locais, Lei do Regime das Taxas das Autarquias Locais, Lei do Regime Financeiro das Autarquias Locais,  Lei Orgânica sobre as Eleições Autárquicas e Lei sobre o Regime Geral da Cooperação Interautárquica.

Os outros diplomas são a Lei Orgânica sobre a Organização e Funcionamento das Autarquias Locais, Lei da Transparência de Atribuições e Competências do Estado para as Autarquias Locais, a Lei da Tutela Administrativa sobre as Autarquias Locais, Lei que Aprova o Estatuto Remuneratório dos Titulares dos Órgãos e Serviços das Autarquias Locais e a  Lei Orgânica da Guarda Municipal.

Estes diplomas, promulgados pelo Presidente da República, definem o quadro geral de atribuição de competências da função autárquica, composição e funcionamento, assim como os princípios e regras.ART/IZ





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