Benguela – Três cirurgias de alta complexidade realizadas pelo Hospital Geral de Benguela, dando resposta à cada vez mais crescente lista de espera dos pacientes oriundos de várias partes do país, dominaram as atenções da sociedade benguelense durante o ano que hoje termina.
Por José Honório, jornalista da ANGOP
A primeira cirurgia foi de implantação de prótese de silicone em Angola a um paciente de 24 anos que nasceu sem nariz, devido a uma condição rara chamada arrinia, mas que já recuperou a função respiratória por via nasal.
A intervenção cirúrgica, que envolveu 36 médicos, entre angolanos e cubanos, foi histórica por ter sido também a primeira do género no país, sendo que no mundo foram registados pouco menos de 50 casos de arrinia até hoje.
O segundo procedimento está relacionado com a primeira cirurgia de prótese parcial da anca, numa paciente de 42 anos, que padecia de uma fratura subcapital do fêmur, com mais de três meses de evolução, e que, de acordo com fontes médicas, já recuperou a sua mobilidade.
A terceira, também inédita, foi uma cirurgia do Plexo Braquial no Hospital Geral de Benguela (HGB), para a recuperação dos movimentos de um dos membros superiores num paciente, de 26 anos, oriundo de Luanda, e que agora paciente poderá recuperar o movimento do braço direito.
O Hospital Geral da Baía Farta não ficou de fora, uma vez que realizou as primeiras cirurgias a pacientes com ileostomia e colostomia, com o objectivo de melhorar a qualidade de vida de pessoas que enfrentam problemas de saúde específicos, como doenças intestinais, câncer ou trauma abdominal.
No decurso do ano, a província de Benguela recebeu do Ministério da Saúde seis novas ambulâncias equipadas com meios modernos para reforçar a assistência à população dos municípios da Baía Farta, Benguela, Bocoio, Catumbela, Chongoroi e Lobito.
Outro acontecimento marcante foram as primeiras Jornadas Nacionais de “Medicina Ocupacional”, numa promoção da Centralab - Clínica Dr. Hugo Azancote de Menezes, sob o lema “Olhar de forma global o trabalhador como elemento central de uma unidade económica e produtiva”.
O evento juntou, no Centro Sócio-Pastoral Dom Amaral dos Santos, profissionais da área, gestores públicos e entidades governamentais das províncias de Benguela, do Bié, de Luanda, da Huíla e do Huambo, que discutiram directrizes e recomendações para a implementação de políticas públicas no segmento da medicina ocupacional, para um futuro mais seguro e saudável para os trabalhadores em Angola.
Relativamente à educação, outro sector prioritário na agenda do Executivo, o ano foi marcado com a entrega de várias novas salas de aulas, com destaque para aquelas construídas em escolas já existentes, em quase todos os municípios, para reduzir o máximo possível o número de alunos que estudam em condições precárias.
Em causa está um “Plano Estratégico da Educação”, com foco na construção de novas salas em unidades escolares, no quinquénio 2023-2027, numa altura em que 45 por cento do universo de 12 mil e 600 salas de aula existentes na província de Benguela são improvisadas.
A propósito, após a entrega de 10 novas salas, erguidas na Escola BG 1237, nos arredores da cidade de Benguela, para beneficiar pelo menos 1.200 alunos, o governador provincial, Manuel Nunes Júnior, reconhecendo o problema, afirmou que o número de salas precárias ainda é muito alto.
“O diagnóstico é de que temos ainda muitas escolas com salas de aula com condições precárias e temos que gradualmente ir resolvendo esse tipo de dificuldade”, admitiu, considerando, por exemplo, a entrega dessas 10 novas salas como passo importante nesse sentido.
No domínio académico, o Instituto Superior Politécnico de Benguela (ISPB) voltou a lançar novos quadros para o mercado de trabalho, elevando para mais de quatro mil licenciados desde 2011.
Trata-se de licenciados em 14 cursos ministrados por essa instituição de ensino superior privada, sediada em Benguela, entre os quais Enfermagem, Medicina Dentária, Análises Clínicas, Fisioterapia, as engenharias de Telecomunicações, Electrónica, Informática e Agropecuária, bem como Gestão do Ambiente e Ensino Primário.
Além de Benguela, a cobertura formativa do ISPB abrange estudantes de 15 outras províncias do país, principalmente Cabinda, Moxico, Lunda-Norte e Lunda-Sul, Cuanza-Sul e Huíla.
PGR com melhores serviços
No sector da justiça, a província de Benguela dispõe de um novo edifício provisório para a Coordenação da Região Judiciária Centro da Procuradoria Geral da República (PGR), para atender quatro províncias e 12 comarcas.
Com vista à desconcentração dos serviços centrais da PGR, de forma a aproximar a justiça à comunidade, a Região Judiciária Centro engloba as províncias de Benguela, Bié, Cuanza-Sul e do Huambo. Foi instituída em 25 de Março de 2021.
Ao todo, 157 magistrados do Ministério Público no activo e 17 jubilados e 354 técnicos de justiça preenchem o quadro orgânico da Região Judiciária Centro, com o fito de conferir maior celeridade no tratamento das reclamações e preocupações dos cidadãos junto da estrutura superior hierárquica da PGR.
Fez igualmente eco a nomeação do novo juiz desembargador presidente do Tribunal da Relação de Benguela (TRB), Baltazar da Costa, em substituição do juiz desembargador Adelino Tupita.
Nos últimos três anos, o Tribunal da Relação de Benguela, que faz parte da III Região Judicial, recebeu 280 processos-crimes, maioritariamente relacionados com casos de ofensas corporais graves e homicídios.
Antigos combatentes mais valorizados
Outro destaque do ano foi a atribuição gratuita a 496 antigos combatentes de passes electrónicos de acesso a um número ilimitado de viagens nos autocarros públicos, que circulam nas vias urbanas do litoral - Benguela/Catumbela/Lobito e Benguela Baía/Farta e vice-versa.
Desta forma, os antigos combatentes podem utilizar de forma gratuita o serviço de transporte público, através de passes sociais electrónicos “Gira Mais”, emitidos pela Empresa Nacional de Bilhética (ENBI), apurou a ANGOP.
Ao todo, estão emitidos 496 dos pouco mais de 500 passes electrónicos “Gira Mais” previstos inicialmente, para a utilização gratuita dos transportes públicos por parte desta classe social, no âmbito de um memorando entre o Ministério da Defesa Nacional e Veteranos da Pátria (MINDENVP) e a Empresa Nacional de Bilhética.
Cruzadas evangelísticas e marco histórico da IECA
Na vertente religiosa, foi destaque a reinauguração na marginal da praia Morena do importante marco histórico da fundação, em 1880, da Igreja Evangélica Congregacional em Angola (IECA). Esta denominação religiosa tem mais de três milhões de fiéis, dos quais 70 mil na província de Benguela, distribuídos em 12 missões e em 2.620 congregações.
Era 11 de Novembro de 1880, quando três missionários americanos provenientes de Portugal, nomeadamente Bagster, William Henry Sanders e Samuel Taylor Miller chegaram a Angola, desembarcando na antiga ponte-cais da praia Morena, hoje em ruínas, e fundaram a IECA.
Outro evento cristão mais marcante em 2024 tem a ver com as cruzadas evangelísticas realizadas nas cidades de Benguela, Huambo e Lobito, que alcançaram mais de 422 mil pessoas, das quais 171 mil e 770 convertidas ao Evangelho de Jesus Cristo.
Liderada pelo evangelista americano Randy Roberts, a Grande Cruzada Evangelística de Milagres do ministério Christ of all Nations (Cristo para todas as Nações/CfAN), uma organização evangelística criada em 1974 pelo falecido missionário alemão Reinhard Bonnke, atraiu fiéis de várias denominações cristãs em Angola.
Cultura e desporto
O ano de 2024 foi marcado por exposições de artes plásticas, lançamento de livros, espectáculos musicais, quintas culturais, stand up comedy, teatro, recital de poesia, provas de Kupapatas e Kaleluias, torneiros de futebol, campeonato internacional de Jiu Jitsu, tiro aos pratos, corrida de atletismo, ciclismo, cavalos e karting.
Destaque para a mostra individual intitulada “Impressões”, com 16 obras do estilo abstracto, da autoria da artista plástica franco-brasileira Ana Quirin, realizada na galeria do Museu Nacional de Arqueologia de Benguela (MNAB).
As obras, expostas em Maio, variam de dois e seis metros de comprimento e, em vez do habitual estilo clássico – os aros e as telas esticadas - Ana Quirin deu asas à sua criatividade artística ao pintar em panos samakaka de origem angolana.
O festival de música "Walale Benguela", que voltou a estar ao rubro, para comemorar os 407 anos de fundação da cidade de Benguela, arrastou milhares de fãs para o Estádio de Ombaka, habitual palco do evento.
Pelo palco passaram vozes conceituadas, com destaque para a cantora Chelsea Dinorath, o músico de estilo hip-hop NGA, do grupo Força Suprema, a diva da música angolana Yola Semedo e o músico Matias Damásio.
Outro marco de 2024 foi o Prémio Nacional de Cultura e Artes, sendo que a categoria de Teatro, pela primeira vez, foi atribuída ao Colectivo de Artes Ombaka pelo conjunto da sua obra e trajectória artística ininterrupta 19 anos depois.
Fundado a 5 de Março de 2005 em Benguela, o Colectivo de Artes Ombaka aposta na sua internacionalização e já realizou espectáculos no Rio de Janeiro (Brasil), em Maputo (Moçambique) e Aveiro (Portugal).
O Colectivo de Artes Ombaka já exibiu mais de duas dezenas de peças teatrais, entre elas “A vida verdadeira de Domingos Xavier”, “Meu amor da rua 11”, “Baixa de Cassanje”, “Mulher em 3D”, “Macumba”, “Quando a realidade atinge” e “Sonhei com Manguxi”.
Também o artista plástico Joaquim Teixeira “Tchombé” foi distinguido como vencedor da categoria de Artes Plásticas do Prémio Nacional de Cultura e Artes 2024.
No que ao desporto diz respeito, Benguela está no centro das atenções, particularmente no Campeonato Nacional de Futebol da primeira divisão, o Girabola, onde ocupa o segundo lugar. O mérito é da equipa do Wiliete, com 32 pontos, atrás apenas do Petro de Luanda.
Abalo sísmico surpreende Benguela
Outro acontecimento que marcou a vida dos benguelenses no ano de 2024 foi o registo de dois abalos sísmicos entre os meses de Junho e Julho.
O primeiro, de magnitude 5.4 na escala Richter, sucedeu a 5 de Junho, enquanto o segundo, 4.4 na escala de Richter, ocorreu a 3 de Julho, cujo epicentro foi a aproximadamente 31 quilómetros do município de Caluquembe, na Huíla.
Apesar de não terem provocado vítimas nem danos materiais, o ligeiro abalo sísmico, sentido à noite durante alguns segundos em vários municípios da província de Benguela causou algum medo à população.
Exemplo disso foi o primeiro abalo sísmico, na manhã do dia 5 de Junho, que, embora moderado, abanou ligeiramente vários edifícios na cidade de Benguela e suscitou dezenas de chamadas para o Instituto Nacional de Emergências Médicas de Angola, que mobilizou oito ambulâncias para atender os munícipes.
Na altura, o susto gerado devido ao fenómeno natural, que apanhou os benguelenses de surpresa, levou dezenas de alunos do Instituto Médio Politécnico Privado Wiliete a abandonar em pânico o edifício, causando alguns desmaios.
Fúria da natureza
Neste ano, Benguela enfrentou chuvas excessivas - mais de seis mil e 200 milímetros de água contra os mil e 600 mm previstos, que devastaram mais de 37 mil e 800 toneladas de produtos agrícolas, entre cereais, frutas, leguminosas e verduras, destruindo ainda nove mil e 347 hectares cultivados.
As intensas chuvas registadas até Maio de 2024 também deixaram a nu os problemas recorrentes das descargas eléctricas atmoféricas, que causaram a morte de 62 pessoas e de 57 cabeças de gado bovino, sobretudo nos municípios do interior: Ganda, Chongoroi e Balombo.
As descargas e inundações destruíram duas mil infra-estruturas familiares, deixando 10 mil famílias camponesas em estado de vulnerabilidade, sendo o mais afectado o município do Balombo, onde morreram pelo 13 pessoas atingidas por raios.JH/CRB/SR