Pesquisando. PF Aguarde 👍🏽 ...

Qualidade urbanística de Luanda passa pela manutenção das infra-estruturas - arquitecta

     Entrevistas              
  • Luanda • Sexta, 24 Janeiro de 2025 | 20h35
Arquitecta Djamila Cassoma
Arquitecta Djamila Cassoma
DR

Luanda – A manutenção contínua de infra-estruturas ligadas às habitações e às vias de comunicação constitui um dos factores que concorrem para a qualidade urbanística e arquitectónica da cidade de Luanda, que comemora 449 anos da sua fundação este sábado, 25, segundo a arquitecta Djamila Cassoma.

Por António Neto e Quinito Bumba, jornalistas da ANGOP

Em entrevista à ANGOP, a propósito de mais um aniversário da capital angolana, fundada a 25 de Janeiro de 1576, a especialista acredita ser possível mudar o actual quadro urbanístico de Luanda, se cada um dos luandenses desempenhar devidamente o seu papel, primando pela educação cívica e moral dos cidadãos.

A arquitecta aponta, igualmente, a necessidade de se criar espaços de educação sobre urbanismo e arquitectura no seio familiar e no ensino formal, para que se tenha uma província bem estruturada e com um saneamento básico aceitável.

Por outro lado, Djamila Cassoma realça a necessidade de se ter maior atenção com o surgimento de vários bairros informais nos espaços adjacentes às centralidades ou urbanizações, para evitar a pressão que a “velha cidade de Luanda” sofreu ao longo dos 449 anos de existência.

Para isso, a arquitecta defende a definição de estratégias que consigam concretizar a implementação dos planos de ordenamento do território e planos directores, ferramentas fundamentais para se ter uma cidade estruturada e funcional.

Eis a íntegra da entrevista

ANGOP: Antes de mais, agradecemos a sua presença e seja bem-vinda ao espaço grande entrevista da ANGOP para falar sobre os desafios e as perspectivas de Luanda, do ponto de vista urbanístico e arquitectónico, no quadro das celebrações dos 449 anos da capital angolana.

Djamila Cassoma (DC): Muito obrigada pelo convite. Para mim é sempre uma honra falar sobre Luanda, por ser a nossa casa comum e cartão postal de Angola, aonde, diariamente, chegam diversos visitantes. Sinto-me, igualmente, satisfeita em contribuir e partilhar conhecimentos para melhorarmos a qualidade urbana da nossa cidade.

ANGOP: A cidade de Luanda enfrenta inúmeros problemas, desde o saneamento básico, mobilidade urbana e falta de uma cintura verde. Como caracteriza, actualmente, esta urbe, do ponto de vista da sua matriz arquitectónica 449 anos depois?

DC: A cidade de Luanda tem características muito particulares da sua história e dos vários processos urbanísticos que sofreu, desde a sua fundação, em 1576, sendo que as acções urbanísticas começaram na época colonial, com o surgimento das primeiras acções de planeamento e desenho urbano. Porém, essas acções foram superadas pelo crescimento exponencial da cidade de Luanda, com o surgimento de construções informais e anárquicas, registando apenas 10% do casco urbano formal.

ANGOP: Que opinião tem sobre as duas características urbanísticas de Luanda, a colonial e a pós-colonial?

DC: Realmente, temos uma Luanda com duas características arquitectónicas, sendo o primeiro momento marcado pela arquitectura colonial ou cidade velha, que projectou a cidade para menos de um milhão de habitantes, enquanto o segundo é marcado pelo crescimento de áreas informais, fruto do crescimento da população.

Para minimizar a informalidade e reduzir o défice habitacional, o Governo teve de desenvolver algumas acções planeadas, com a construção de centralidades e execução de alguns planos urbanísticos.

ANGOP: Como caracteriza a relação entre a cidade velha e a pós-colonial?

DC: Bem, a relação não tem sido muito saudável, porque o crescimento da cidade não está a acompanhar o crescimento demográfico (populacional), que é exponencial. Só para se ter uma ideia, a cidade foi planificada para albergar menos de um milhão de habitantes, mas actualmente e, antes da nova Divisão Político-Administrativa, estimava-se que Luanda tinha mais de 10 milhões de habitantes, facto que motiva o surgimento de construções desordenadas.

Portanto, estamos a falar de uma pressão e um casamento de muito atrito, porque as infra-estruturas existentes não estavam preparadas para esse “boom populacional”, que originou as ocupações sem processos formais, em que o cidadão não tem a titularidade nem a posse da terra, tendo muitas vezes ocupado zonas indesejáveis ou de risco.

ANGOP: Depois de identificados os problemas, que soluções se pode avançar para se ter uma Luanda bem estruturada do ponto de vista urbanístico?

DC: Todos nós, os luandenses, que aqui residimos diariamente somos confrontados com os problemas que a urbe apresenta, mas o pulo do gato é pensar em soluções viáveis e sustentáveis. A primeira mensagem que passo é que nós temos de acreditar que é possível, dentro, claro, das nossas condições financeiras e técnicas, factores que confluem para as soluções.

Também é possível mudar o actual quadro urbanístico se cada um de nós desempenhar devidamente o seu papel, primando pela educação cívica e moral dos cidadãos, pela educação sobre urbanismo e arquitectura, bem como assegurar a manutenção das infra-estruturas. Ou seja, o nosso modelo de educação familiar até ao ensino formal tem de ser estruturado para melhorar a qualidade urbanística.

ANGOP: Quanto ao surgimento das centralidades e urbanizações, com realce para a primeira e maior centralidade do país, o Kilamba, qual é o seu ponto de vista sobre a qualidade e manutenção do parque habitacional de Luanda que também apresenta sinais de degradação e inundações na época chuvosa?

DC: Sou daquelas cidadãs que teve o prazer de fazer parte dos projectos de construção e gestão habitacional de Luanda, em particular, e do país, em geral, com realce para as centralidades do Kilamba, do Sequele e da Vida Pacífica. O que me deixa satisfeita é que foram projectos que tiveram a participação directa dos angolanos.

Actualmente, o debate que surge em torno dessas centralidades é, se calhar, se foram ou são eficazes até hoje. A meu ver, essas centralidades foram benéficas numa primeira instância, por permitir o acesso à habitação de milhares de angolanos que tiveram a oportunidade de concretizar o sonho da casa própria, numa altura em que a carência de casas era muito alta.

Apesar desse benefício, as centralidades ainda continuam a enfrentar o desafio da cidade antiga, com destaque para a questão da macro-drenagem de Luanda, que não acompanhou a expansão das urbanizações, facto que provoca inundações sempre que chove. Outro aspecto que também se precisa melhorar é a questão da mobilidade urbana.

A par disso, as centralidades enfrentam, igualmente, o desafio das ocupações ou loteamentos e construções de habitações nos terrenos adjacentes, factores que exercem pressão às infra-estruturas existentes que foram dimensionadas para urbanizações.

Portanto, se não houver o cuidado necessário com essa pressão que se regista à volta de quase todas as centralidades do país, através da planificação das infra-estruturas adjacentes, vamos ter o que se passou com Luanda, com o crescimento da massa orgânica informal que exerceu pressão sobre as infra-estruturas que estavam antes dimensionadas para menos de um milhão de habitantes.

É necessário também que se olhe com maior atenção para a questão do saneamento básico dessas centralidades, onde já se regista a infestação de ratos, por exemplo. Esta questão tem tudo a ver com a manutenção da cidade, gestão de resíduos sólidos e de uma série de infra-estruturas que ajudam a mitigar a existência de ratazanas, baratas, entre outros répteis que fazem mal à saúde pública.

ANGOP: Até que ponto os planos de ordenamento do território e planos directores ajudariam a atenuar as ocupações informais dos terrenos adjacentes às centralidades?

DC: Mais do que falar dos planos de ordenamento do território e planos directores, parece-me consensual que já está mais do que na hora, do ponto de vista geral, Angola maximizar esses planos, com a definição de estratégias que consigam a sua implementação, por serem ferramentas fundamentais para se ter uma cidade estruturada e funcional.

No sector da habitação há uma política interessante que eu louvo, que é a autoconstrução dirigida e assistida, é uma das políticas habitacionais que impacta todas as províncias e Luanda, sem dúvida, como é aquela que tem a maior fatia demográfica do país, não está isenta desses planos. Por isso, temos que partir para acções concretas para também ajudar a melhorar e a mitigar o efeito da carência habitacional.

ANGOP: Na sua opinião, o que está na base do atraso para a implementação desses planos?

DC: A implementação dos planos directores e de ordenamento do território obedecem a várias etapas e requisitos. Por um lado, as administrações precisam de técnicos capacitados e habilitados para perceber o conteúdo de um plano director. Outro aspecto são os mapas, uma vez que depois é preciso sair do papel para a acção, ou seja, é necessário descascar o conteúdo em miúdos e em pequenas fracções.

Esses aspectos passam pela formação das equipas que vão manusear os documentos, bem como pela fiscalização, porque os territórios são dinâmicos e existem áreas que, se calhar, foram mapeadas como zonas industriais e hoje estão ocupadas por habitação. Por isso, é preciso que a própria fiscalização seja mais célere para orientar a população que uma determinada zona não é apropriada para construção.

Portanto, a implementação desses planos requer muito tempo, facto que exige a criação de outras alternativas para mitigar as construções desordenadas, enquanto se aguarda pelos planos.

ANGOP: Nos últimos tempos, Luanda tem-se deparado com um número elevado de edifícios que apresentam fortes indícios de ruir, devido ao tempo e à sobrecarga. Que soluções aponta para a mitigação desta situação?

DC: A questão dos edifícios, infelizmente, é um problema de Luanda e também de outras províncias. São edifícios coloniais, cuja origem dos seus problemas está na ausência de manutenção e alteração das próprias estruturas, com a construção de anexos e outros empreendimentos nos edifícios, sobrecarregando as infra-estruturas e suas redes técnicas.

As soluções para esse problema já tem sido apresentadas pelo departamento ministerial de tutela, que tem estado a fazer um bom trabalho de mapeamento, para aferir dos edifícios em risco de ruir e que podem ser reabilitados e daqueles que não oferecem tantos riscos. Parece-me também que alguns, inclusive, já foram alvos de orçamentação para o tipo de intervenção que deverão sofrer.

Porém, esse problema deve servir de lição no cuidado que devemos ter com a preservação do nosso património comum.

ANGOP: Os espaços verdes de Luanda têm sido ocupados pelo betão armado, com o surgimento de vários edifícios. Como se pode conciliar a construção de infra-estruturas e a preservação dos espaços verdes e de lazer?

DC: Tal como acontece em outras cidades do mundo, em Luanda também é possível fazer-se um casamento perfeito entre o betão e os espaços verdes. O que se precisa fazer é criar um pulmão verde, que possa dar qualidade ao ar ou ao meio ambiente, com a possibilidade de ser acoplado aos espaços públicos de lazer. A criação deste pulmão verde contribui significativamente para a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos.

Também é possível criar jardins verticais e recuperar os espaços degradados, como alternativas inovadoras, aliando o urbanismo à preservação ambiental, permitindo equilibrar o crescimento urbano e o bem-estar da população. Precisamos de ser mais criativos e visionários, para termos uma cidade sustentável.

Para isso, é necessária a conjugação de esforços entre o Governo, as empresas e os cidadãos, com vista a transformar Luanda numa cidade mais inclusiva e organizada.

ANGOP: Quais são os principais desafios de Luanda do ponto de vista urbanístico?

DC: Um dos primeiros desafios de Luanda é o saneamento básico, que constitui um dos calcanhares de Aquiles da maior parte dos países africanos, em geral, sobretudo nas capitais destes países, que concentram a maior parte da população.

Paralelamente ao saneamento básico, junta-se também a questão habitacional de Luanda, onde apenas cerca de 10 por cento é constituído pelo casco urbano formal e tudo o resto são territórios que foram crescendo de forma desordenado, por causa da necessidade básica do ser humano, ter uma casa.

O outro desafio de Luanda também está relacionado com a qualidade urbana, ou seja, a falta do perfeito equilíbrio entre as áreas ocupadas e desocupadas. Nas zonas desabitadas, nota-se a ausência de espaços públicos com qualidade e espaços verdes, para que os cidadãos possam fazer uma vida social de qualidade.

Depois temos um problema sério com a mobilidade urbana, que, apesar de registar melhorias em algumas infra-estruturas, ainda se debate com a escassez de transportes públicos para atender a demanda da população.

ANGOP: Para terminar a nossa entrevista, que comentário pode fazer sobre a comemoração dos 449 anos de Luanda?

DC: Bem, primeiro, os meus parabéns a todos nós e a esta nossa bela cidade, Luanda, que está um bocadinho maltratada pelas más acções de alguns cidadãos que vandalizam os bens públicos.

Para mim, todo habitante de Luanda devia olhar no espelho e dizer: eu amo a minha cidade, por isso, não devo deitar o lixo de qualquer jeito nem destruir o património comum, por exemplo.

A solução para uma cidade saudável e harmoniosa tem como base a unidade que deve existir entre o Governo, o cidadão, as organizações ou empresas, que devem trabalhar juntos para superar os inúmeros desafios que Luanda enfrenta. ANM/QCB/OHA/IZ





Fotos em destaque

Praça Doutor António Agostinho no Huambo ascende à Património Cultural Nacional

Praça Doutor António Agostinho no Huambo ascende à Património Cultural Nacional

 Segunda, 20 Janeiro de 2025 | 14h14

Angola figura entre 52 destinos turísticos do mundo em 2025

Angola figura entre 52 destinos turísticos do mundo em 2025

 Segunda, 20 Janeiro de 2025 | 12h49

Presidente João Lourenço mobiliza mais de 430 milhões de euros em França

Presidente João Lourenço mobiliza mais de 430 milhões de euros em França

 Segunda, 20 Janeiro de 2025 | 12h36

Cabinda com mais de 994 milhões metros quadrados livres de minas

Cabinda com mais de 994 milhões metros quadrados livres de minas

 Segunda, 20 Janeiro de 2025 | 12h30

Exposição fotográfica retrata trajectória do andebol angolano em África

Exposição fotográfica retrata trajectória do andebol angolano em África

 Segunda, 20 Janeiro de 2025 | 12h27

Documentário exalta trajectória de Elias Dya Kimuezo

Documentário exalta trajectória de Elias Dya Kimuezo

 Segunda, 20 Janeiro de 2025 | 12h23

Repovoamento das espécies atrai turistas no Parque do Iona

Repovoamento das espécies atrai turistas no Parque do Iona

 Segunda, 20 Janeiro de 2025 | 12h16

PLANAGRÃO regista primeiros resultados no Lóvua (Lunda-Norte)

PLANAGRÃO regista primeiros resultados no Lóvua (Lunda-Norte)

 Segunda, 20 Janeiro de 2025 | 12h12


A pesquisar. PF Aguarde 👍🏽 ...
+