Benguela – Volvidos 11 anos desde a retomada da circulação ferroviária entre o Lobito (Benguela) e o Luau (Moxico), a aposta na reabilitação e modernização das infra-estruturas do Corredor do Lobito entra agora numa etapa crucial com a visita do Presidente Joe Biden a Angola.
Por Carlos Benedito, jornalista da ANGOP
Nos últimos 18 meses, os Estados Unidos da América (EUA) mobilizaram quase cinco mil milhões de dólares para investimento no Corredor do Lobito (CL) e em novos projectos de energias limpas, incluindo a solar, bem comonoutras iniciativas de apoio à população e pequenos agricultores.
Os EUA afiguram-se, assim, como um membro importantíssimo para o desenvolvimento desse gigante Corredor transfronteiriço, que liga 40% da população angolana ao longo do seu traçado nas províncias de Benguela, Huambo, Bié e Moxico, regiões atravessadas pelo Caminho-de-Ferro de Benguela (CFB).
A expectativa, com esta visita, é o reforço dos investimentos norte-americanos nas infra-estruturas desse importante projecto que liga Angola, República Democrática do Congo (RDC) e Zâmbia.
Se no território angolano foram feitos já importantes investimentos na recuperação da linha-férrea, construção de pontes, estações, infra-estruturas logísticas, aquisição de locomotivas, vagões e nas telecomunicações, impõe-se que se faça o mesmo na RDC e na Zâmbia.
Só desta maneira será possível dinamizar as trocas comerciais entre os três países, numa primeira fase, e o transporte de minérios críticos, a partir da RDC e da Zâmbia para os EUA, Europa e Ásia.
Actualmente, o transporte de minérios provenientes da RDC para o Porto do Lobito leva, em média, 45 dias, situação que urge inverter drasticamente, possibilitando,assim, um maior e mais rápido escoamento dessas matérias-primas para o mercado mundial.
A visita de Biden está a ser encarada, deste modo, comoum balão de oxigénio para novos investimentos no CL, sobretudo na sua segunda fase.
Esta segunda fase compreende a construção de 800 novos quilómetros da linha ferroviária que atravessa Angola, RDC e Zâmbia, que se somarão aos 1.344 quilómetros já existentes e que estão a ser renovados.
O objectivo é reduzir, para menos de uma semana, os custos e o tempo de trânsito de mercadorias provenientes do Sul da Zâmbia e da RDC e vice-versa.
Estes investimentos também abrem o acesso a terras agrícolas aráveis e reforçam a cadeia de abastecimentos de minerais energéticos críticos, impulsionando o desenvolvimento económico regional.
A cimeira que acontece esta quarta-feira (4), nos arredores da cidade centro-costeira de Benguela, com as presençasdos Presidentes de Angola, EUA, RDC, Zâmbia e Tanzânia, afigura-se como crucial na definição de novas intervenções no CL.
São investimentos que poderão não apenas dinamizar o transporte de minérios e as trocas comerciais, mas também transformar a vida de milhares de cidadãos que residem ao longo do seu traçado, nos três países, assim como vão representar uma porta aberta de oportunidades para pequenas e médias empresas.
O CL joga uma importância estratégica para o mundo, pois vai possibilitar ligar os oceanos Atlântico e Índico, encurtando a ligação entre a América e a Ásia.
"Se conseguirmos ligar os dois corredores, o comércio mundial ganhará com isso. O tráfego marítimo será feito com mais facilidade, com maior segurança, em menos tempo e a custos mais competitivos", disse, recentemente,o Presidente angolano, João Lourenço.
Esta importância do Corredor do Lobito, prosseguiu, é maior actualmente, quando se assiste a uma grande insegurança no Mar Vermelho, outra rota importante para o comércio internacional, mas que, há um bom tempo, se encontra numa situação de insegurança considerável.
"Mesmo que se venha a resolver a situação de segurança no Mar Vermelho, o Corredor do Lobito continuará, portanto, em vantagem", afirmou.
A visita de Biden está, assim, envolta em grandes expectativas, pelo reforço dos investimentos não só no CL, mas também noutros sectores da economia angolana.
Como disse o Chefe de Estado angolano, João Lourenço, em entrevista ao ‘New York Times’, essa visita transmite sinal de confiança aos negócios dos EUA e é uma forma de convidar os empresários norte-americanos a investir em diversos sectores da economia do país.
"Até agora, o investimento norte-americano que tivemos está focado na indústria de petróleo e gás. Esperamos que, com a sua chegada, possa haver uma diversificação desse investimento nas várias áreas da nossa economia", ressaltou.
Classe empresarial benguelense expectante
A classe empresarial benguelense olha para o desenvolvimento do CL como uma oportunidade soberana para o crescimento dos seus negócios com os países vizinhos.
Homens de negócios dos sectores agrícola, piscatório, salineiro, industrial e da hotelaria e turismo ‘piscam o olho’ ao Corredor, esperando que possa abrir novos mercados e atrair clientes para o país, em geral, e para a província de Benguela, em particular.
A província de Benguela é, actualmente, a maior produtora de sal do país, com uma produção acima das 200 mil toneladas por ano, cujo excedente já tem chegado, ‘de forma ainda tímida’, sobretudo à RDC.
Para além do sal, a produção agrícola benguelense, com destaque para o feijão, já tem abastecido o mercado congolês por via do CFB, infra-estrutura crucial do CL.
Junta-se aqui também a fileira do peixe, principalmente o seco, com quantidades consideráveis a terem como destino a RDC.
Para o empresário António Noé, proprietário da Indu-Agri, empresa ligada à produção agrícola e comercialização de insumos, a visita de Joe Biden e o reforço do investimento americano no CL devem ser encarados como uma oportunidade única para a dinamização dos negócios.
Referiu que já tem feito contactos com o presidente da autoridade de investimentos privados da Zâmbia, na sua busca por parcerias em matéria de produção de insumos agrícolas.
Aconselhou os demais empresários benguelenses a primar pela organização e modernização dos seus serviços, para que possam estabelecer parcerias e ser competitivos no vasto mercado emergente.
"A RDC e a Zâmbia são grandes mercados que podemos utilizar não só para exportarmos os nossos produtos, mas também para serem fontes para a aquisição de conhecimentos", afirmou.
Relativamente ao sector industrial, as empresas, ao nível de Benguela, ainda estão mais viradas para as necessidades do mercado interno, mas abertas a possíveis parcerias com empresários dos países encravados (RDC e Zâmbia).
Neste segmento, o presidente do Conselho de Administração do Pólo de Desenvolvimento Industrial da Catumbela (PDIC), Miguel Correia, informou que estão a trabalhar numa política de atracção de investimentos, quer nacional, quer estrangeiro.
Na sua opinião, o CL vem posicionar o PDIC como ponto estratégico para que os empresários nacionais e estrangeiros possam instalar-se e fazer os seus investimentos.
"Estamos a olhar para a parte externa do próprio Pólo, aquilo que existe em termos de infra-estruturas de apoio que proporcionam vantagens para qualquer investidor", fez saber.
O PDIC irá expandir-se, futuramente, para o loteamento do Biópio/Catumbela, numa área de 1.500 hectares, a 25 quilómetros do Porto do Lobito e do CFB, e a 11 da captação de água no rio Catumbela.
Neste momento, a zona industrial conta com uma subestação fotovoltaica, a maior do país, com uma produção de 188 megawatts, construída pela empresa norte-americana Sun Africa e pela MCA.
Corredor do Lobito
Com gestão privada por um período de 30 anos, através do Consórcio ‘Lobito Atlantic Railway’, formado pelas empresas Vecturis, Trafigura e Mota Engil, o Corredor do Lobito integra o Porto, o Terminal Mineiro, o Aeroporto Internacional da Catumbela e o CFB, cuja linha se estende por mil 344 quilómetros de extensão até ao Luau, no Moxico.
Dado o papel estratégico para o desenvolvimento económico regional, foram investidos mais de dois mil milhões de dólares na reabilitação e modernização das infra-estruturas e meios circulantes do CL.
O objectivo é dinamizar o transporte de mercadorias diversas, beneficiando os três países fronteiriços (Angola, RDC e Zâmbia).
O Executivo angolano já projecta a construção da linha de 259 quilómetros de extensão, que vai ligar o país à Zâmbia, partindo do município de Ruacano (Moxico) até à região fronteiriça zambiana de Jimbe.
A recuperação das vias-férreas da Zâmbia e da RDC é fundamental para permitir a sua interligação ao CFB, na zona do Luau, na fronteira de Angola, e, com isso, revitalizar o transporte de minério para o Lobito.
As duas principais infra-estruturas do Corredor (Porto e CFB) preparam-se, deste modo, para enfrentar o desafio que se avizinha, por via dos novos investimentos, assim como do interesse norte-americano e da União Europeia (UE) em aumentar o movimento de carga na região.
A criação da Agência de Facilitação de Transporte de Carga do CL vai acelerar o crescimento do comércio doméstico e transfronteiriço, através da implementação de instrumentos harmonizados de facilitação do comércio, promovendo a participação efectiva de pequenas e médias empresas em cadeias de valor.
O CL apresenta uma rota estratégica alternativa para os mercados de exportação da RDC e da Zâmbia e oferece a rota mais curta que liga as principais regiões mineiras dos dois países sem acesso ao mar (RDC e Zâmbia). CRB/IZ