Paris (Do enviado especial) – Criadas há quase meio século, vilas Olímpicas e Paralímpicas podem deixar um legado urbanístico para as cidades-sede ou se transformarem em "elefantes brancos", contrariamente ao objectivo de tornaram-se sinónimo de legado pós-evento.
Do enviado especial da ANGOP, Marcelino Camões
Na verdade, a criação de um espaço de concentração de centenas de atletas de todo o mundo, de destintas modalidades, visa permitir a interacção entre os residentes por via desta vertente social, baseada no princípio do “fair-play” e do respeito pelas diferenças, não obstante os resultados desportivos.
É por este factor que o imóvel é construído em zonas menos privilegiadas, muitas vezes de alguma tensão sociopolítica, para que os princípios nobres intrínsecos do desporto contribuam na socialização, se não mesmo para tréguas ou estabelecimento da paz pós-conflito armado.
Na era moderna, as infra-estruturas erguidas para os jogos permitem aos municípios promover a imagem no mundo e também contribuem, significativamente, para deixar símbolos, monumentos e patrimónios nos locais-sede.
Contam-se três tipos de legado urbano que os Jogos Olímpicos e Paralímpicos podem deixar: a renovação das áreas existentes, a construção de novas zonas urbanas e a melhoria das redes de infra-estruturas e de telecomunicações
No histórico das competições, os Jogos Olímpicos, idealizados e implementados pelo barão francês Pierre de Coubertin (edição de estreia Atenas1896) e os Paralímpicos, pelo neurologista, Ludwig Guttman (edição de estreia Roma1960) foram já utilizados três projectos de vila.
Algumas são consideradas modelo de transformação urbana, como, por exemplo, a de Barcelona (Espanha), Munique (Alemanha), mas também existe o inverso, que resultaram em “elefantes brancos”.
São casos disto mesmo, os Jogos de Berlim1936, submetidos a processos de gentrificação, ou seja a expulsão de moradores para transformação de bairros periféricos em áreas nobres, destinadas à especulação imobiliária.
Pelo menos três das quatro sedes dos últimos eventos enfrentaram críticas sobre o processo de gentrificação. Londres2012, Rio de Janeiro2016 e agora Paris2024, colocam em questão a capacidade das cidades de usarem os Jogos e suas vilas para criar um legado habitacional.
Nas primeiras edições das competições polidesportivas os atletas ficavam hospedados em hotéis, casas de famílias, barcos ou edifícios militares.
Quando organizou pela primeira vez o evento, em 1924, Paris foi pioneira numa nova concepção de vilas, mas elas só se transformaram em construções para serem utilizadas após os Jogos quase três décadas depois.
Nos Jogos de Amsterdão (Holanda), a criação de uma vila temporária foi cogitada, mas não se concretizou. Em 1932, em Los Angeles (EUA), o conjunto de habitações tinha capacidade para dois mil atletas, mas foi projetado para ser temporário.
Foi a partir da edição de Helsinque em 1952 (Finlândia) que as vilas passaram a ser estruturas permanentes. Foram construídos 13 prédios com 545 apartamentos, que se transformaram em área residencial.
Desde então, pelo menos 13 cidades-sede utilizaram os espaços das vilas para transformar em moradia, pública ou privada, assumindo uma forma que foi incluída nas estratégias centrais das “metrópoles” anfitriãs.
Para os eventos olímpicos e paralímpicos (Paris2024), este último decorre até ao próximo dia oito, a França seguiu a tradição secular e elegeu construir o imóvel num subúrbio da capital francesa. No total, são 82 prédios pré-fabricados, localizados às margens do “lendário” rio Sena.
A Vila Paralímpica de Paris2024 garante a indispensável acessibilidade, conforto e uma experiência de alto nível.
Situada em Saint-Denis, ao norte de Paris, a vila possui mais de quatro mil atletas e respectivas equipas técnicas.
A construção da Vila Paralímpica segue rígidos padrões de acessibilidade universal. Desde os quartos até os espaços de convivência, tudo foi adaptado para atender às necessidades específicas dos atletas com deficiência.
Rampas, portas automáticas, pisos antiderrapantes e elevadores amplos são apenas alguns dos recursos pensados para facilitar a mobilidade e garantir que todos possam se locomover com segurança e autonomia.
Além da acessibilidade, a vila também foi desenvolvida com foco na sustentabilidade. O projecto busca minimizar o impacto ambiental, utilizando materiais ecológicos e tecnologias de economia de energia.
Após os jogos, a infra-estrutura será convertida num novo bairro residencial, com moradias acessíveis e espaços públicos projetados para promover a inclusão social, refletindo o legado duradouro dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos.
A Vila Paralímpica está localizada próxima ao Stade de France e outros locais de competição, permitindo fácil deslocamento dos atletas para seus eventos, numa altura em que cidadãos, particularmente desta comuna francesa de Saint-Denis reclamam por direitos.
Mais de 94 700 habitantes reclamam por melhores condições de vida e de trabalho, esperando-se que a "magia" do desporto, como já ocorreu em vários países do mundo, amenize ânimos e projecte entendimento entre governo e governados.
Além das instalações de treino, a vila também contará com áreas de lazer, centros de bem-estar e serviços médicos de última geração para garantir que os atletas tenham todo o suporte necessário.
Com vistas para o rio Sena e rodeada por áreas verdes, a casa temporária de atletas de todo o mundo proporciona um ambiente acolhedor e inspirador, mas também oferece uma atmosfera de convivência e celebração das diversas culturas representadas nos jogos, entre as quais a de Angola. MC/ADR