Nairobi - O Supremo Tribunal do Quénia invalidou hoje um processo de revisão constitucional iniciado pelo Presidente Uhuru Kenyatta, pondo fim a uma controvérsia política, a quatro meses das eleições presidenciais e legislativas.
"O Presidente não pode iniciar alterações constitucionais ou mudanças através do processo de iniciativa popular. (...) A emenda constitucional de 2020 é inconstitucional", disse a presidente do Supremo Tribunal, Martha Koome, bloqueando assim o processo de extensão do executivo.
A decisão formal não foi anunciada após seis horas de leitura das sentenças e das razões de cada um dos sete juízes do mais alto tribunal do país, estando o anúncio previsto para terça-feira.
Mas nas suas respectivas apresentações, seis dos juízes consideraram que o chefe de Estado não tinha o direito de lançar esta revisão, de acordo com o procedimento conhecido como "iniciativa popular", reservado aos cidadãos.
Contudo, uma maioria dos juízes considerou que tal mudança no sistema de Governo é possível em substância, invalidando o argumento dos opositores do texto de que existe uma "estrutura básica" intangível na Constituição que não pode ser revista.
A decisão frustra, pelo menos temporariamente, os planos do Presidente Kenyatta, uma vez que o Quénia, a potência política e económica da África Oriental, se prepara para as eleições, a 09 de Agosto.
A reforma, designada por Iniciativa Construir Pontes (BBI), visava alterar a Constituição de 2010, que estabeleceu um sistema presidencial de Governo, criar, entre outras coisas, um cargo de primeiro-ministro, dois vice-primeiro-ministros e um líder da oposição e aumentar o número de assentos no parlamento.
O Presidente Kenyatta diz que a reforma se destina a mitigar o actual sistema de "apostas vencedoras", o qual considera que tem sido a causa de conflitos pós-eleitorais ao longo da história do país.
No Quénia, os períodos eleitorais foram marcados pela violência em várias ocasiões, nomeadamente em 2007-2008, quando mais de 1.100 pessoas foram mortas e centenas de milhares deslocadas.
Mas os opositores do BBI, liderados pelo vice-presidente, William Ruto, viram-no como um estratagema do chefe de Estado, que não está autorizado a concorrer a um terceiro mandato nas eleições de Agosto de 2022, para se manter no poder como primeiro-ministro.
William Ruto foi inicialmente apoiado por Kenyatta como seu sucessor, mas o vice-presidente tem sido cada vez mais marginalizado desde 2018, após uma aproximação inesperada entre Kenyatta e o antigo adversário Raila Odinga, apesar de ser rival vitalício nas urnas.
A teimosa promoção do BBI por ambos os homens acabou por alimentar a especulação sobre um possível pacto de partilha de poder entre os dois, caso Odinga se torne presidente em 2022.
Em Março, Kenyatta endossou oficialmente Odinga, que enfrentará Ruto no escrutínio a 09 de Agosto.